Universidade de Brasília, Novembro de 2002
Departamento de Filosofia
Disciplina de Introdução à Prática Filosófica
Professora: Ana Miriam Wuensch

Primeiro Texto de
INTRODUÇÃO À PRÁTICA FILOSÓFICA

Marcus Valerio XR
02/98255

O objetivo deste texto, denominado "documento" por nossa professora, me ficou bastante claro, mas o mesmo não se deu exatamente com qual deveria ser o seu conteúdo. Isso porém não me despertou qualquer preocupação, pois desde o princípio eu já possuía uma idéia do que iria escrever.
Embora não tenha sido solicitada uma auto biografia nesta ocasião, isso sim está claro, tenho alguma dificuldade em não me apresentar quando escrevo algo com um teor aberto e introdutório, além do que minha breve história pessoal me parece uma boa forma de abordar aquele que quero tornar o elemento mais desenvolvido neste texto, a minha percepção do que chamo de Crise de Identidade da Filosofia.
Numa disciplina introdutória a alunos que pretendem cursar filosofia numa universidade, não posso deixar de esperar que alguma conceituação sobre o objeto de estudo desta faculdade seja dado, ainda que seja uma conceituação não compartilhada por muitos, uma vez que é notável uma certa dificuldade em se definir o "Amor a Sabedoria". Creio ser vital porém, que cada pessoa que se proponha a estudar tal campo do conhecimento humano, tenha em si ao menos uma idéia razoavelmente clara do mesmo, a exemplo dos professores que já se apresentaram perante os alunos desta disciplina, que demonstraram ter uma convicção a respeito embora não tão rapidamente explicável, e com as quais concordo em grande parte, considerando que cada qual enfatizou aspectos específicos.
Não me admira entretanto que haja tanta dificuldade em se encontrar uma definição simples e razoável de Filosofia no meio acadêmico, quanto mais extra acadêmico e até mesmo nos dicionários. Mesmo em livros introdutórios como por exemplo "Filosofia para Principiantes" de Richard Osborne, editora Objetiva, nota-se que há algo estranho em explanar durante quase 200 páginas sobre um assunto e ao final perceber que a pergunta "O que é Filosofia" simplesmente não foi respondida.
Não me admira porque como proponho, o meio acadêmico, a própria cadeira de Filosofia, me parece estar envolvida numa notável confusão com relação ao significado, sentido e aplicação de sua própria área. Nada realmente grave, pois tenho certeza de que a grande maioria dos filósofos e estudiosos de Filosofia tem uma idéia clara do que ela seja, porém têm dificuldade de expressar sua idéia, e invariavelmente caem numa pequena ilusão tão sutil quanto persistente quando discursam sobre a mesma.
Voltando à minha pessoa, explicarei porque considero a questão desta forma e como isso se relaciona a minha história pessoal, e portanto pretendo definir melhor o problema e ao mesmo tempo me apresentar ainda que não com muita profundidade. Aqueles que se interessarem mais por minha auto biografia, minhas proposições e posições sobre o assunto e pelo sistema filosófico que tenho desenvolvido, a Filosofia EXERIANA, poderão procurá-los em meu site: www.xr.pro.br.

XR

Três décadas me separam da madrugada em que, tardiamente, abandonei o confortável ventre materno para me expor diretamente ao ar deste planeta. Digo tardiamente porque minha gestação ultrapassou as 40 semanas recomendadas, devia estar bom lá dentro, e é como só tivesse aceitado nascer no sábado para aproveitar o fim de semana, além de já ser fim de ano.
Minha infância foi saudável, tranquila e feliz, assim como católica, classe média e urbana, ainda que isso possa soar contraditório para algumas pessoas. Me lembro na mais tenra idade, 6 a 8 anos, de ter feito por iniciativa própria meu primeiro silogismo categórico, muito antes de ouvir o nome Aristóteles pela primeira vez na "pele" de um robô da tele série Buck Rogers.
Eu recebera há algum tempo a notável revelação de que todos os dias nasciam pessoas, e posteriormente me foi informado que os tão bem quistos aniversários eram na verdade comemorações baseadas no dia de nascimento das pessoas.
Logo pensei, "então... todo dia é o aniversário de alguém!".
Essa descoberta pessoal e genuína tinha a propriedade de me encher de expectativas felizes, pois logo percebi que se eu conhecesse um número suficiente de pessoas, todos os dias teria uma festa de aniversário para ir! Claro que para uma mente infantil aniversário significa, bolo, chapeuzinhos, "parabéns para você" e etc.
Ainda na infância deduzi por mim mesmo o paradoxo da existência interdependente de Deus e do Universo como Causa e Efeito. Expliquei para meu pai que havia percebido um dilema, eu acreditava em Deus porque se Ele não existisse o Universo não existiria, mas por outro lado, quem criou Deus?
Por sorte tive em casa um ambiente propício para a reflexão, meu pai ficou alegre e me elogiou pela questão, ao passo que conheço pessoalmente famílias onde a mesma questão poderia ter sido repreendida como blasfema.
Em minha infância tudo o que eu queria era ser um cientista, uma meta clara para mim. Certa vez cheguei a declarar a uma prima que reclamava de meu desinteresse em procurar namoradas, que "Minha paixão era a Ciência". Mesmo hoje me sinto incrivelmente identificado com o personagem principal do desenho animado "O Laboratório de Dexter".
Já na adolescência as transformações hormonais associadas ao nosso modelo cultural me ajudaram a me direcionar mais fortemente para a Arte, onde após estudar piano clássico e adquirir meu teclado eletrônico tentei por mais de uma vez montar uma banda de Rock, ao passo que pouco antes me tornara um autêntico micreiro, me debruçando várias horas sobre computadores elaborando programas e traçando gráficos, numa época em que mouse e sistemas operacionais visuais eram sonhos distantes.
Na idade adulta, após dois vestibulares frustrados, um para Ciência da Computação, única área que poderia absorver minha paixão precoce por produzir gráficos e jogos em computador, e outro para Física, onde fui reprovado devido a uma redação dissertativa sobre o Amor, finalmente fui aprovado para Desenho Industrial, trazendo a tona outra de minhas peculiaridades, que como todas as outras, sempre me acompanharam. A paixão por desenhar.
Entrar na UnB, no ano de 1993, mudou minha vida. Primeiro porque comecei a tomar contato mais organizado com o conhecimento, ao mesmo tempo que frequentava escolas de gnosticismo após uma década de kardecismo, segundo porque tive a oportunidade de me tornar profissional na área de Computação Gráfica Tridimensional, com a qual trabalho até hoje, e terceiro por que me casei.
As exigências familiares me tiraram do período diurno da universidade e impossibilitaram meu prosseguimento no curso. Possuindo vago apenas o período noturno, passei novamente no vestibular para o curso de Língua Japonesa, já tendo concluído duas matérias sobre o idioma ainda durante o curso de Desenho Industrial, pois a cultura nipônica sempre fora outra de minhas fixações, que me levara a treinar Judô, Karatê, assistir toneladas de filmes de ninjas e adorar seriados japoneses.
Durante esse curso porém uma coisa despertou em mim, ou melhor dizendo, se consolidou em mim. Cada vez mais o conhecimento me prendia a atenção. Estando num curso de Licenciatura frequentei disciplinas de psicologia da aprendizagem, pedagogia, linguística e literatura que me reforçaram ainda mais meu interesse pela erudição.
Fatores pessoais me levaram também a ler com frequência cada vez mais intensa até começar a escrever, principalmente Ficção Científica, uma de minhas maiores paixões. Minha busca pelo transcendente também se acelerou e por fim tive uma experiência mística durante a leitura de um certo livro que me deixou em estado de graça por 3 dias.
A coroação absoluta deste processo veio quando cursei simultaneamente a disciplina de Introdução a Filosofia e um curso de Filosofia a maneira Clássica numa instituição teosófica denominada Nova Acrópole.
Então, finalmente, encontrei minha paixão maior e definitiva.
Me tornei um Amante de Sophia.

AMANTE DE SOPHIA

Se não era uma autobiografia que deveria ser desenvolvida neste texto, porque escrevi o que está acima? Porque aqui foi dito quase tudo o que é preciso saber para perceber de forma inequívoca que a Filosofia sofre de um problema sério de identidade. Minha história pessoal pode ser a prova cabal de que há uma confusão sobre o conceito de Filosofia que permeia não só a sociedade como o próprio meio acadêmico. Está tudo explicado aí em cima, tanto minha definição de Filosofia quanto a crise.
Uma crise tão notável que permitiu que alguém que propunha explicações próprias para o funcionamento da realidade desde a infância, que não se satisfazia com qualquer sistema religioso por exigir sempre mais racionalidade do que eles poderiam dar, que vasculhara vários campos de atividade humana tendo lido vários livros e cursado matérias das mais diversas cadeiras, descobrisse só aos 27 anos o que é Filosofia! E em que se aplica! E receber como uma pedrada a constatação drástica e arrebatadora que me levou a dizer para mim mesmo em tom de ironia: "Ei... Eu sou filósofo!"

Para mim o significado de Filosofia é tão claro e radiante quanto a paixão resplandecente pela própria Sophia. Posso estar equivocado e sei que muitos podem não concordar, mas estou tão certo disso quanto está o homem perdidamente apaixonado, de que encontrou a musa ideal.
Percebi, com ajuda no gnosticismo, que a cultura humana tem 4 pilares básicos. A ARTE, a MÍSTICA, a CIÊNCIA e a FILOSOFIA. Não necessariamente nesta ordem, e sim! Elas tem uma ordem! Embora todas tenham estado presente em potência desde que o primeiro Homo sapiens caminhou sobre a terra, elas se desenvolveram uma sob a guarda da outra. Se a Filosofia não for mãe da Ciência, ela é, ou foi, no mínimo sua mestra, sua instrutora e guardiã. Assim como o fora a Mística da Filosofia, ou talvez a Arte. Ainda não tenho certeza...
Não! Eu acabo de ter certeza! Agora, às 1:54 da madrugada, (horário de verão), do dia 14 de Novembro de 2002, acabo de finalmente concluir que a Mãe, ou Mestra da Filosofia é a Arte, que é filha, ou discípula da Mística, que surgiu instantaneamente quando a primeira centelha de consciência humana iluminou o Universo. (Seria ideal no momento a trilha sonora "Assim falava Zaratustra" de Straus, utilizada no filme 2001 - Uma Odisséia no Espaço.)
O processo que levou a ter tanta clareza sobre o que é Filosofia é um pouco extenso para ser reproduzido aqui, estando disponível em meu site, mais especificamente em Filosofia EXERIANA.
Mas posso definir Filosofia como:

"Campo do conhecimento humano focado principalmente na Racionalidade e na Intuição que visa entender qualquer aspecto da realidade, ou toda ela."

Nada está a salvo da investigação filosófica, tudo pode ser pensado, não há limites concebíveis para o pensamento. A Filosofia pode se apoiar em qualquer gama de dados como suporte, ou pode partir praticamente do nada, e tal ou qual postura pode ser mais ou menos desejável dependendo do objetivo a que persegue. Com meu próprio sistema de pensamento consigo diferenciar com facilidade e clareza a Arte, "Transmissão de conteúdos emocionais por via indireta", a Mística, "Atividade que visa atingir um possível plano supra material, primordial e final", ou a Ciência, "Área da atuação pautada da Racionalidade e no Empirismo", da Filosofia. Lembrando que essas definições foram dadas de forma simplificada.
Com isso, pude ver com relativa facilidade que uma série de problemas intelectuais atuais reside na simples confusão entre Filosofia e Ciência, e/ou Filosofia e Mística, e como recentemente fui perceber para meu espanto, até mesmo entre Filosofia e Arte!
Dois elementos chaves podem ser retirados das apresentações dos 4 professores que estiveram com nossa turma, elementos oriundos de autores distintos com conceitos sobre Filosofia que tendem a se chocar.
O primeiro elemento, enunciado pelo Professor Samuel, está contido na idéia de que qualquer atividade filosófica atual não baseada ao menos superficialmente no conhecimento científico dificilmente trará contribuições acadêmicas significativas. Proposição que levantou a justa indagação de um de nossos colegas de que se a Filosofia não poderia desta forma estar a serviço da Ciência.
A Segunda colocação, que me foi a mais inédita, foi feita pelo professor Wilton, ao destacar o fato essencialmente óbvio mas pouco percebido de que a Filosofia é um Eterno Presente, e que não deve se confundir com a Ciência.
As posições destes professores não são antagônicas, mas tendem a levar a desenvolvimentos que costumam sim se confrontar, pois como eu já disse temos uma crise de identidade da Filosofia que a faz pensar que é, ou deveria ser Ciência, e assim tem sido para muitas pessoas.

CRISE DE IDENTIDADE

Dizer que a Filosofia é mãe da Ciência, ou melhor dizendo das ciências, é afirmar principalmente o fato inquestionável que quase todas as grandes áreas tidas hoje legitimamente como Ciência se originaram na Filosofia, tendo depois se emancipado e assumido um modo próprio de funcionamento.
Esse método científico possui características que foram consolidadas tendo como base as idéias de alguns filósofos, em especial Occam, Descartes, Hume, entre outros. Trata-se de um procedimento notadamente rígido, meticuloso e que só pode admitir como válidas proposições passíveis de comprovação física ou matemática.
Podemos nos referir a essa característica como o faz o professor Wilton, uma característica Positivista. Capaz de acumular conhecimento de forma progressiva e superar estágios anteriores definitivamente.
Evidentemente tal coisa não pode ocorrer na Filosofia, onde não ocorre de fato uma superação definitiva de modelos teóricos anteriores e isso por si só, mais o fato de que o Empirismo é domínio da Ciência, deveria ser suficiente para clarear o motivo pelo qual Filosofia e Ciência apesar de compartilharem o Racionalismo, se diferem notoriamente em seus métodos e sobretudo seus objetos de pesquisa, sendo os da Filosofia evidentemente inacessíveis ao empirismo.
Mas eis que desde o Século XVIII surgiu uma peculiar expressão que persiste até hoje, uma espécie de eufemismo capaz de disfarçar uma certa área do conhecimento com uma roupagem que sugere características que ela simplesmente não possui em grau suficiente para apresentar um teor Positivista.
Esse termo é conhecido como "Ciências Humanas", em contraposição às Ciências Exatas, ou Naturais.
Não deveria ser necessário muito esforço para perceber que esse termo denota uma área do conhecimento humano que em geral está muito mais relacionada á Filosofia do que a Ciência, mas entretanto, como insisto, essa Crise de Identidade da Filosofia, essa curiosa ilusão, consegue fazer com que muitos resistam a essa constatação ainda tentando dar a tal ou qual área de estudo de extrema inexatidão e subjetividade o estatuto de "Ciência".
Esse é o principal motivo da Crise de Identidade a que me refiro, algo extremamente simples como creio irá a maioria concordar, mesmo assim ela persiste, e tem em seu meio ardorosos defensores.
Foi muito bem colocado por nossa professora que de acordo com uma certa colocação em sala, a Filosofia poderia estar submetida à Ciência da mesma forma que outrora esteve à Religião, quando praticamente não havia atividade filosófica não teológica.
Nessa época a vedete, a Religião, dominava o cenário, e todas as áreas do conhecimento que quisessem se sobressair de um modo ou de outra procuravam seu aval. O mesmo hoje em dia ocorre com relação à nossa musa, a Ciência. Todos querem o ar de cientistas, do cientificamente estabelecido, e dessa forma muitos preferem nomear sua área como "ciência", ainda que com o flagrante adjunto "humana", para partilhar desse estatuto tão privilegiado da atividade Positivista.
Isso não se resume apenas ao meio acadêmico. Podemos ver os mais variados ramos culturais humanos invocando o estatuto de ciência. Espiritismo, Astrologia, Ufologia, Criacionismo e inúmeros outros. Todos parecem querer parecer mais confiáveis e "sérios" ao se anunciarem como Ciência.
É certo que o uso generalizado da palavra "Ciência", inclusive com o apoio dos dicionários, é milenar. Num sentido mais lato senso qualquer coisa pode ser ciência. Mas aqui, num contexto mais exigente, propõe-se a utilização de termos e conceitos com um grau maior de precisão e esclarecimento, pois a simples pergunta "História é Ciência?", não pode ser respondida satisfatoriamente a não ser esclarecendo o significado que se espera do termo ciência.
Por fim, o que gosto sempre de chamar a atenção é para o curioso fato que pode ser visto na simples descrição das diversas faculdades em nosso âmbito Universitário. Temos um curso de Filosofia, e vários cursos de Ciências Exatas e Humanas. O que afirmo é que simplesmente podemos entender as Ciências Humanas como Filosofias, ramos especializados da atividade filosófica, alguns com maior ou menor grau de aplicação de método científico mas sem conseguir atingir o grau de objetividade que o configure como ciência exata. Tal como denunciam algumas Universidades que ainda guardam no nome da cadeira geral de Humanas o termo Filosofia.
Se nos deixamos apanhar nessa sutil ilusão que o termo Ciência Humana produz, temos a impressão ao ver uma faculdade distinta com o nome de Filosofia, que trata-se de algo a parte, uma algo a mais ou a menos qualquer. Alguma atividade isolada que pouco diz respeito às outras. Não obstante, qualquer aluno de humanas deve necessariamente percorrer inúmeros campos da Filosofia para compreender sua área específica. Fica evidente logo no primeiro semestre que ninguém escapa dos filósofos. Mal se consegue ler algumas páginas de um texto específico da área sem ouvir nomes famosos da Filosofia.
Digo sem receios que antropólogos, historiadores, psicanalistas, sociólogos, economistas e etc, são filósofos! Ainda que especializados em determinadas áreas.
Mesmo assim a ilusão persiste. Não temos uma faculdade de "Ciência", porque então, poderia-se perguntar, temos uma de Filosofia se a mesma esta fragmentada nas mais diversas áreas tidas como Ciências Humanas? Porque não estudar Filosofia dentro de cada segmento específico como se faz com a Ciência?
Esta última questão, deixarei por hora em aberto.

Marcus Valerio XR
17 de Novembro de 2002


Universidade de Brasília, Novembro de 2002

Segundo Texto de
INTRODUÇÃO À PRÁTICA FILOSÓFICA

Deixei de abordar no texto anterior aquilo que talvez fosse o objetivo principal, o questionamento direcionado pela professora que reside na pergunta: Existem Filósofas?
É evidente que esta pergunta não visa na realidade uma resposta simples, mesmo porque é previsível que uma maioria irá faze-lo positivamente. É inegável que mulheres tem produzido obras filosóficas ao longo da história ainda que na obscuridade, e hoje em dia a presença feminina na Filosofia é fato inconteste.
O que essa pergunta pretende é instigar uma reflexão, e talvez cobrar uma explicação de porque o papel feminino não só na Filosofia como em diversas áreas do conhecimento e sociedade tem sido relegado a um plano marginal. Ao instigar tal reflexão é desejável também que se adote posturas mais diretas no sentido de superar a ilusão cultural que prega a inferioridade feminina e que formule métodos de compensar a discriminação histórica e incitar ainda mais a total reversão desse quadro.
Outro desenvolvimento para essa pergunta é no que diz respeito à natureza da prática filosófica, se ela poderia ser considerada assexuada, ou se haveria uma filosofia masculina em contraposição a uma feminina, e o que caracterizaria tal "gênero" filosófico. Apenas a produção ter sido desenvolvida em sua maioria por homens? Como colocou o professor Wilton ao denunciar que qualquer tentativa feminina de se produzir filosofia estaria impregnada de uma "masculinadade"? Haveria nesse sentido uma atividade filosófica feminina pura?

GÊNESES

Antes porém de se tentar responder essas perguntas devo retomar a questão que deixei em aberto no texto anterior, mesmo porque se não ficar claro o que se pode considerar como Filosofia, tais respostas se tornam impossíveis. Ou seja, pouco se pode fazer se permanecermos na ilusão da crise de identidade filosófica.
Primeiro devo esclarecer ainda mais o que penso sobre a Filosofia, e uma forma de fazer isso é exemplificando que textos podem ser considerados predominantemente filosóficos ou não.
Se examinarmos uma obra como a Bíblia, feita até se prove o contrário por seres humanos, e mais especificamente o famoso texto do Gênesis, para que a idéia fique mais acessível, digo que é inadmissível considerar tal texto como filosófico. Trata-se apenas de uma narrativa mitológica, não há um só porquê conectivo, nenhuma preocupação em validar suas posições, os elementos são descritos de forma espontânea sem pretenderem se mostrar coerentes, factíveis ou abertos a discussão.
Já se examinarmos as obras de Allan Kardec, para as quais também ignorarei a alegação sobrenatural, notaremos uma metodologia similar a dos tratados intelectuais de sua época, século XIX. Uma ampla preocupação com a argumentação racional, inclusive baseando-se em axiomas. Porém duas coisas me impedem de reconhecer Kardec como filósofo. Primeiro o fato dele não assumir suas obras como tratados filosóficos mas sim revelações transcendentes, segundo porque apesar de sua maior elaboração, ainda pode-se notar falhas na arquitetura argumentativa de seu textos, que seriam drasticamente exploradas caso a obra fosse apresentada ao meio acadêmico de forma aberta e convidativa a toda forma de análise.
Portanto considero os livros básicos do Espiristimo Kardecista como quase filosóficos, o que jamais poderia ser dito da Bíblia ou da Teogonia de Hesíodo, ou das obras Homéricas, ou outros clássicos do poema épico.
Fico muito preocupado ao ver que pode-se confundir Arte com Filosofia. Nesse sentido qualquer conto de fadas, estória ou anedota poderia ser considerado como obra filosófica, o que seria no mínimo um desastre interpretativo uma vez que estariam igualadas a obras como as de Marx, Espinosa ou Kant, e não posso acreditar que alguém não veja a diferença entre essas duas naturezas literárias.
Não obstante, fui eu mesmo quem disse que a Filosofia é filha da Arte, e dessa forma não deveria ser aceitável tão conFUSÃO da mesma forma que um texto Filosófico pode se confundir com um Científico?
Juro por Deus que estou me aventurando nessa questão pela primeira vez, aqui as 21 horas do dia 19 de Novembro de 2002, embora já esteja acostumado a começar a escrever sem ter uma idéia clara do que irá ser de fato produzido.
Vejo agora que o termo "filha" não é muito propício a uma colocação de descendência entre uma área da atividade humana ou outra, mas insisto que podemos dizer que a Filosofia foi despertada pela Arte assim como despertou a Ciência.
Tenho dois argumentos para tal, mas primeiro devo explicar que entendo que Ciência, Filosofia, Arte e Mística/Religião, estão presentes em potência em qualquer fenômeno humano, podendo apenas não estarem devidamente elaboradas. Não se pode negar que qualquer agrupamento humano neste planeta possui suas técnicas para manipular a natureza, uma "pré-Ciência", assim como códigos linguísticos e representações sociais, bem como posturas morais, uma pré-Filosofia. Da mesma forma ainda mais inegável é a presença maciça da Mística em qualquer sociedade humana, ainda que não devidamente estruturada na forma de instituições religiosas ou teologia. E a Arte me parece evidente por si própria, não há cultura humana sem músicas, esculturas, desenhos e etc.
Porém toda essa potência humana está em Caos numa sociedade primeva, há um entrelaçamento contínuo entre cada atividade, fundindo principalmente Religião com Filosofia e Ciência com Arte, fusões que podem ser observadas mesmo em sociedades bem mais avançadas culturalmente como as orientais desde a história antiga, onde a técnica e a arte se misturam, e onde é quase impossível separar conteúdos filosóficos dos místicos.
Ao longo do desenvolvimento humano essas áreas vão sendo então mais desenvolvidas, de modo que me parece tranquilo afirmar que a Arte/Ciência e Mística/Filosofia surgem muito provavelmente simultaneamente, embora com maior ênfase nos primeiros termos de cada fusão. Creio que pinturas rupestres já denunciem isto.
Pessoalmente considero que a primeira atividade humana a despertar é a Mística. Creio que se um momento sublime e decisivo tiver ocorrido a algum pré-humano que o tenha transformado em humano, esse evento foi a primeira relação de Causa e Efeito não imediata, que conectou dois conceitos distintos de um modo tão marcante e irresistível que não resisto a tentação de formar uma imagem apoteótica de um antropóide arregalando os olhos e olhando para o céu sob, mais uma vez, o som de Straus. O monolito negro não precisa estar incluso.
Isso coincide com o despertar da Intuição, um dom exclusivamente humano, que ao se unir aos demais planos "mentais" irá produzir o despertar da humanidade. É bem verdade que nesse momento uma boa dose de técnicas já pode até ter sido desenvolvida, mas estou me referindo a algo exclusivamente humano, pois mesmo chipanzés e gorilas podem improvisar ferramentas e usar técnicas transmitidas inclusive pelos humanos. Já esse fenômeno ao qual me refiro é algo mais sublime, mais íntimo e subjetivo e que dificilmente poderá ser explicado. Já estou conformado com a idéia de que o nascimento da Mente plenamente humana permanecerá um inspirador mistério, insondável, bem como a "criação" do Universo, deixando lacunas para toda a sorte de divindades para o desespero do ateístas radicais.
É um momento onde, mesmo já tendo antes feito algumas relações não imediatas de causa e efeito, esse pré-humano simplesmente associa algo de modo completamente inédito. Por algum motivo, o raio que atingiu a árvore, o vento que soprou ou o nascimento do Sol, fez pela primeira vez a pré-mente humana ligar o fato a uma finalidade, querer ver uma intenção oculta nas nuvens, no ar ou no horizonte distante.
Em algum evento como esse, proponho, o primeiro Ser se tornou Humano no momento em que deduziu, ou mais provavelmente induziu, a existência de uma vontade consciente presente nos fenômenos naturais, foi quando pela primeira vez ele se sentiu diante da natureza como se esta fosse um Ser que lhe guardasse uma certa semelhança.
Creio ser esse o grande salto para a Mente começar a buscar finalidades em tudo, na chuva, nas doenças, nas estrelas, na morte, na existência. Tudo isso acompanhado de uma série de outras atividades que vão sendo reforçadas por esse novo paradigma, essa nova consciência que permite por intermédio do contraste entre a própria existência e a de um aparente Ser mítico imanente, aperfeiçoar a consciência de "espécie", de grupo, de significado como ser vivente.
É no âmbito religioso que as artes se aperfeiçoam, nas esculturas de deidades, nas canções de deslumbramento com a natureza ou nos totens mágicos. E nesse espírito que surgirão então as artes mais avançadas, os poemas, as representações pré-teatrais.
Milhares de anos depois teremos uma estrutura artística muito mais desenvolvida, capaz de por sua vez induzir a emancipação de uma outra forma de ver a realidade, e é aqui que a Arte despertará a Filosofia.

Como disse antes tenho dois argumentos para tal, o primeiro é mais facilmente defensável, creio eu, do que tudo o que foi dito logo acima. Trata-se do fato de que nossa tão falada Filosofia Ocidental surgiu num ambiente rico em manifestações artísticas. Os poemas épicos, eróticos e religiosos podem ser considerados precursores da reflexão filosófica, de modo que alguns dos primeiros filósofos também foram poetas. Foi necessário o aperfeiçoamento de uma série de discursos e recursos linguísticos para que a Filosofia surgisse, o que se deu através do desenvolvimento artístico. É claro que pode-se considerar também a Mística da época, em especial o Orfismo, de um modo ainda um tanto caótico. Mas insisto em considerar que somente um linguajar artisticamente aprimorado, presente na própria saga de Orfeu, permitiu a advento e a emancipação da Filosofia.
O segundo argumento é ego-ontegênico. Dado minha facilidade por abstrair universais de certas experiências primárias, que ainda que precipitada costuma me dar bons resultados, traço em mim mesmo o retrospectivo entre o despertar final de meu pensar filosófico e a influência da Mística e mais diretamente da Arte.
Na época eu era recém saído de uma onda de gnosticismo e esoterismo em geral, porém foi através da Arte que minha atividade filosófica se consolidou. Minhas letras de música contém as sementes de minhas proposições filosóficas e foi em meus livros de Ficção Científica que elaborei meus primeiros textos argumentativos mais ousados, que posteriormente se aperfeiçoaram e se separaram.

Dito tudo isto, só resta afirmar que a Filosofia, embora esteja relacionada com todas as demais 3 áreas do cultura humana, tem um lugar específico, não é somente um acaso histórico, mas é parte de um processo evolutivo inevitável da aventura do Ser Humano na Terra, e que se repete em cada um de nós.

A NOVA MUSA

Que posso com isso responder agora quanto as proposições de se eliminar a faculdade de Filosofia das Universidades?
Posso dizer que esse é o supra sumo da Crise de Identidade da Filosofia, e a coroação da distorção visual que faz não pontos de vistas, mas campos de cegueira. Tal idéia só pode ser concebida por alguém que está profundamente mergulhado na confusão intelectual pós iluminista de teor positivista desmedido.
Caso a faculdade de Filosofia fosse extinta, a pesquisa filosófica evidentemente não iria parar, sendo então continuada nos compartimentos das especialidades filosóficas entituladas Ciências Humanas. Da mesma forma que não temos, embora fosse possível e seria até interessante, uma curso geral de Ciência.
Há porém uma diferença fundamental entre Ciência e Filosofia que de tão óbvia parece escapar de nossa estreita amplitude de visão. A Ciência praticamente foi feita para se compartimentalizar, é de sua natureza a especialização. Seu objetivo primo é a perseguição do particular em graus de detalhismo cada vez maiores, por isso ninguém parece sentir muita falta de um curso geral de Ciência, embora insisto que ele seria muito útil.
Por outro lado a Filosofia possui uma natureza muito mais sintética, ela tende a ligar os saberes, ela conecta as diversas áreas do conhecimento na direção de um entendimento mais profundo e amplo, e mesmo quando especifico, repousa em sua matriz primordial a conquista do macro pelo micro, a busca do fundamento em prol do entendimento da totalidade.
É muito curioso que em plena era da globalização, interdisciplinaridade e intercâmbio cultural alguém proponha a extinção da única forma de conhecimento humano que sempre foi global, interdisciplinar e intercambial, e da qual na realidade se separaram as mesmas áreas que hoje em dia percebem que precisam se reconectar.
Acho estranho que os próprios departamentos de filosofia não se manifestem de forma mais hostil a essas proposições, uma vez que é justamente o fenômeno oposto, o escape das áreas específicas para a Filosofia, que tem alimentado sobremaneira grande parte da produção intelectual da área. Poderia até entender que alguém pretendesse defender a idéia de que a faculdade de Filosofia não fosse diretamente aberta ao calouros, mas que sim fosse abastecida por emigrantes de campos específicos do conhecimento dentro da própria universidade, mas me recuso a crer que alguém com um entendimento razoável do que seja filosofia leve a sério essa quimera da sua extinção como campo coeso e organizado, principalmente num planeta onde nunca se conseguiu extinguir sequer Criacionismo, Alquimia, Oráculos e toda a sorte de manifestações culturais consolidadas nos estágios mais subjetivos da experiência humana.

Depois desta apaixonada defesa à "busca por Sophia", quero explicar melhor, já a pedido dos comentários de nossa professora, o porque insisto em afirmar que Ciências Humanas são Filosofia. Cheguei a dizer que não deveria denotar muito esforço tal conclusão, embora admita que o simples estabelecimento desta separação no meio acadêmico já expõe o problema como não tão simples.
Primeiro é preciso encarar o fato de que temos termos confusos, lato sensu, Ciência pode ser quase qualquer coisa, o que então inviabiliza sua aplicação como ordenadora e diferenciadora de áreas de conhecimento. No sentido que buscamos, nos referimos superficialmente a qualquer campo de conhecimento organizado e sistematizado, mas proponho um maior aprofundamento no sentido em que desejamos separar a atividade científica da filosófica.
No sentido estrito, entendo Ciência como:

"Campo do conhecimento pautado na Razão e na Experimentação, marcado pela máxima objetividade e que investiga fenômenos FÍSICOS!!!"

É esse o grande ponto, para diferenciar Filosofia de Ciência além de qualquer dúvida, é preciso que se isole as ditas Ciências Naturais, aliás a meu ver, o único termo sensato que é comumente usado. Considero como Ciência nesse caso: Química, Física, Astronomia, Biologia, Geologia, Paleontologia e suas derivadas.
A primeira consequência drástica desta definição é que ela exclui a Matemática, que nada investiga de físico mas sim conceitos abstratos.
Matemática é Razão pura, sem a Intuição que considero vital para classificar a Filosofia, nem o Empirismo que classifica a Ciência. Os entes matemáticos nada tem haver com o mundo físico, só fazem sentido no mundo mental das relações e idéias.
Quando dizemos que 1+1=2, não conseguimos reproduzir essa relação na realidade. Podemos é claro dizer que ao juntarmos as pessoas individuais de Fulano e Siclana teremos então duas pessoas, mas também podemos juntar em outra ocasião Beltrano e Fulana, e poderíamos dizer que esses dois casais são iguais entre si tal como Dois é sempre Dois?
Dez laranjas não são iguais nem mesmo a outras 10 laranjas, aliás nem uma só é igual a qualquer outra!
A Matématica apenas pode ser relacionada ao mundo real por ser extremamente útil numa série de coisas, mas sua aplicação é restrita. Ela é coerente na medida em que suas relações com o mundo real nos facilitam diversas percepções, mas em termos diretos 3 ou qualquer outro símbolo matemático é tão real quanto um unicórnio cor-de-rosa voador, que ademais pode ser muito útil também para outras aplicações conotativas e simbólicas.
Portanto utilizarei a partir de agora o termo Ciência Natural para diferenciá-la da Ciência "Humana", pois o termo Ciência Dura é muito estranho é o termo Ciência Exata seria pura e simplesmente falso para qualquer coisa que não a própria Matemática.
Essas Ciências Naturais estudam a realidade física, a Matemática é um de seus mais poderosos instrumentos, todas têm que usá-la em alto grau de profundidade. Eles podem ser maximamente objetivas, uma vez que o observador pode guardar um afastamento amplo de seu objeto de estudo. Seus resultados são facilmente replicáveis pois a Natureza é bastante previsível e constante. Não importa quantas vezes soltarmos uma pedra do alto, aquecermos um pedaço de ferro a dois mil graus ou aproximarmos os mesmos pólos de dois imãs, o resultado não varia em qualquer escala notável.
Eventos ainda não controláveis com certeza o serão mediante graus mais apurados de investigação e nesse sentido, como o professor Wilton declarou, as Ciências Naturais são Positivas, progressivas e irreversíveis.
Disso tudo, o que poderia ser dito da História, Sociologia, Economia, Etnologia, Linguística e etc?
As Ciência Humanas não são objetivas, não podem ser, o observador não pode se afastar de seu objeto de estudo o suficiente para garantir não ser afetado pelo mesmo. Todo ser humano e também produto da história, da cultura, dos meios de produção, das mentalidades e afins, num grau muito mais íntimo e recíproco do que é produto do mundo físico. Essa reciprocidade faz toda a diferença, enquanto nós somos afetados e podemos afetar o curso da História, as leis civis, a economia, a Sociedade e etc, nós somos afetados mas não podemos afetar as "leis" da natureza.
As Ciências Humanas não são positivas, seus paradigmas costumam ser cíclicos e mesmo seus aperfeiçoamentos e grandes mudanças de postura não conseguem eliminar completamente a validade de estruturas teóricas antigas além de qualquer dúvida.
É importante notar porém que há gradações. Há níveis variáveis de exatidão e previsibilidade nas Ciências Naturais. A Biologia por exemplo, por estudar estruturas mais complexas tende a ser menos exata que a física, pelo menos no macro mundo, mas é certo que 10ml de Cianeto de Potássio matam qualquer coisa viva.
Não temos nenhuma certeza equivalente em qualquer das Ciências Humanas, ou os planos econômicos dariam certo e as previsões históricas seriam mais precisas. Mal conseguimos resolver a questão de se é possível haver um Ser Humano sem cultura ou se há afinal uma estrutura linguística universal.
O motivo é simples, nenhum objeto de estudo das Ciências Humanas e acessível ao empirismo, não podemos replicar e controlar um experimento com sociedades, personalidades ou idiomas com o mesmo grau de precisão com o que controlamos átomos de Hidrogênio, enzimas ou "Pink e Cérebro" no laboratório. Temos então que nos contentar com projeções, observações abertas, especulações ou experiência imaginárias.
Finalmente o que pode ser dito do objeto de estudo da Filosofia? Praticamente o mesmo. Não podemos replicar o Universo, a Mente, o Ser ou o Devir, não podemos isolar o Conhecimento ou o Belo, nem replicar a Ética ou a Política.
E então, a única diferença acadêmica prática entre as Ciências Humanas e a Filosofia é que se um antropólogo começar a invadir o terreno do psicólogo ou um historiador começar a propor pacotes econômicos, o que pode muito bem fazer, sempre haverá alguém a lembrá-lo da especificidade de sua área, por outro lado Filósofo costuma fazer o mesmo quase que livremente, quem vai negar-lhe o direito de filosofar?
Uma interpelação feita por um de nossos colegas é útil para explicar isso melhor. Um Filósofo pode, e creio que deva, opinar e pensar sobre o que bem entender. Não há nenhuma necessidade de ficar restrito à sua área. Tudo pode ser pensado e questionado.
A grande diferença que acabamos tendo por fim, é que a Filosofia tem se ocupado de questões mais gerais do que as Ciências "Humanas", que são na realidade desmembramentos de cada uma das grandes áreas da Filosofia, como o Direito é da Ética, a Psicologia é da Ontologia, a Sociologia é da Política e etc. sendo estas áreas que não permitem objetividade tal como a Física, que é desmembramento da Filosofia da Natureza.

EXISTEM FILÓSOFAS?

Esperando ter aclarado o que entendo por Filosofia, como posso responder a pergunta "título" desta disciplina de Introdução a Prática Filosófica?
Sim! É evidente que existem e sempre existiram filósofas, ainda que na obscuridade. E com isso forneço a resposta fácil.
Agora tentarei desenvolver a resposta realmente interessante.

Talvez seja uma má influência de nosso idioma que muitos consideram "machista", haja visto a predominância do gênero masculino em coletivos, que nos leve a associar gênero masculino ou feminino a substantivos impessoais. A falta de um pronome específico para os neutros, tal como o IT em Inglês, não raro nos lança em notável confusão.
É possível de alguma forma, como disse o professor Guy Hamelin, que nosso modo de pensar seja afetado pelo nosso idioma de modo a "querermos ver" gênero nos objetos e conceitos.
Mas de qualquer modo não é apenas em Português que Filosofia parece um termo feminino, pois o próprio nome Sophia nos remete a isso. Não foram apenas Boeccio e Kant que viam a Filosofia como uma musa. Fato é que parece existir algum magnífico truque psíquico inato na mente humana que parece remeter os seres humanos a uma projeção daquilo a que se dedicam à uma característica do sexo oposto, e no caso dos filósofos, a ver a Sabedoria como uma Musa.
De algum modo nosso inconsciente, ou equivalente, parece fazer uma poética associação entre o Feminino, o princípio Materno do qual todos nos viemos, homens ou mulheres, e nosso maior "objeto de desejo intelectual", como se aquilo que buscássemos como finalidade última fosse um retorno ao mesmo "princípio materno", a essência pura do Feminino.
É mais ou menos nesse sentido que vejo o modo como os filósofos mais entusiasmados se relacionam com seu campo de conhecimento, é como um romantismo clássico. Sabe-se que nunca se poderá possuir a Musa, mas passa-se toda a vida e despende-se todo o esforço em busca dela.
Arrisco dizer que talvez, de algum modo, essa característica geralmente inconsciente do ato de Filosofar possa talvez afastar algumas mulheres da área. Filosofia parece ser tão "coisa de homens" quanto a própria paixão pelas mulheres. Filosofar seria então um romance intelectual íntimo.
Mas ainda prefiro pensar, e me parece o mais sensato, que Filosofia seja, como qualquer coisa imaterial, desprovida de gênero biologicamente identificável, e aqueles que por ventura tenham lido minha Filosofia EXERIANA tenham paciência com esta aparente contradição.
Quero apenas demonstrar porque não concordo com a idéia do professor Wilton de que tenhamos uma Filosofia Masculina por excelência dado o pensamento acumulado de vários homens ao longo da história.
Primeiro, que a Filosofia não saiu do nada, ela evoluiu de um estado de coisas anterior, é herdeira cultural de toda uma estrutura mental coletiva, e tal estrutura é tão andrógina quanto possível ainda que a maioria dos escritores tenham sido homens.
Não temos como recuar no passado a ponto de saber quem descobriu a escrita ou quem foram os transmissores dos primeiros saberes, mas se partirmos da hipótese de uma "consciência coletiva", quero dizer, de que a cultura humana penetra memeticamente em cada indivíduo, teremos que admitir a androginia de qualquer elemento cutural. Sendo a Filosofia um desses elementos, ou conjunto de elementos, ela é tão andrógina quanto.
Mesmo que quiséssemos listar apenas o nomes de peso da Filosofia, ainda teríamos dúvidas quanto ao grau de participação dos pré-filósofos, dos quais muitos poderiam ser mulheres, principalmente dado a influência religiosa, assim como não temos como avaliar o grau de influência sofrido que cada filósofo recebeu de seus convivas.
Por isso creio que dizer que temos uma Filosofia predominantemente Masculina me parece ilusório, ainda que tal ilusão seja útil e quase irresistível diante de muitos aspectos notáveis.
Um desses aspectos, que ainda pretendo abordar muito mais em futuras ocasiões, é que só conseguimos achar que a Filosofia já pensou de tudo caso adotemos uma ótica, esta sim, predominantemente masculina. Como melhor exemplo, gostaria de citar que dentre tantas perguntas tão extensivamente debatidas em milhares de anos de pensamento, uma questão notável passou praticamente desapercebida até o século XIX, e entendo sua ausência na Idade Média, mas não na Idade Antiga, onde só pode ser explicada por um forte sexismo e androcentrismo que poderiam tornar tal questão um tabu.
Essa questão vem sido debatida no campo da biologia e embora tenha recebido uma boa resposta evolucionista, continua rendendo boas discussões.
A pergunta é: Para que servem os Machos?!?!
Ou elaborando melhor: Porque os machos nas espécies superiores são maiores que as fêmeas?!
Ou colocando essa questão numa perspectiva contemporânea: Uma vez que as fêmeas se ocupam de 99% do trabalho de reprodução, e que a função reprodutória do macho é apenas fornecer uma microscópica porção de DNA, e considerando que a reprodução é prioridade absoluta nas diretrizes funcionais de uma espécie, como então é possível que tenham se desenvolvido machos que não só não colaboram, como atrapalham o trabalho das fêmeas inclusive pondo a vida destas e de suas proles em risco?
Curiosamente, essa questão parece jamais te sido colocada pelos filósofos, e mesmo quando o foi no século XIX, recebeu os tratamentos mais diversos mas ainda grotescamente sobrecarregados de sexismos bem pouco racionais.
Na Idade Média ainda é compreensível que a mesma não tenha sido colocada, pois afinal havia a Bíblia para eliminar qualquer dúvida sobre o assunto, mas custo a crer que todos os sábios da Grécia e Alexandria nunca se ocuparam, até onde sei, de algo tão instigante.

E agora, por falar em Biologia, irei ao ponto mais crucial que nossa questão título levanta:
Porque ao longo da história registrada a metade feminina da humanidade esteve condenada à submissão e ao obscurantismo?

Sinceramente, e já contando com a compreensão dos que me leram até aqui de que eu sofro de uma reprovável falta de modéstia, creio ter a resposta para essa questão, uma resposta bastante simples, que deixarei para o próximo texto.

Marcus Valerio XR
2 de Dezembro de 2002


Universidade de Brasília, Dezembro de 2002

Terceiro Texto de
INTRODUÇÃO À PRÁTICA FILOSÓFICA

Finalmente, esta que deveria ser uma breve dissertação sobre alguns temas levantados em nossa disciplina de Introdução a Prática Filosófica chegará ao seu fim, mais por consenso formal que por conclusão ou esgotamento de assunto. Agora pretendo desenvolver o que chamo de uma resposta realmente interessante para a questão título que tem conduzido o curso. Existem Filósofas?
Como disse no texto anterior, tal pergunta não deve referir-se apenas às filósofas mas às mulheres em geral e portanto, fica convertida em: Porque ao longo da história registrada a metade feminina da humanidade esteve condenada à submissão e ao obscurantismo?
Prometi uma resposta que realmente considero simples, ainda que extensa. Essa simplicidade advém do fato que ouso, na contramão do determinismo cultural disfarçado da atualidade, sob o nome de relativismo e sob a palavra de ordem da escola de Derrida "Desconstruir", apelar para aquilo que considero o único local relativamente seguro para se fazer afirmações mais confiáveis, a Natureza, o mundo físico, ainda que no caso já no complexo âmbito do biológico superior.
Rejeito a posição apática dos paradoxos de causa e efeito que parte das "Ciências" Sociais está imersa hoje, uma estagnação que sob o nome da incerteza subjetiva da história e cultura tem proclamado a impossibilidade de qualquer afirmação ainda que hipotética sobre os fundamentos motores da experiência humana na Terra. É certo que devemos ter muito cuidado com as ilusões culturais, com as armadilhas de pensamento viciado que ao longo dos tempos tanto produziram, e continuam a produzir, toda a sorte de insensatez e falta de visão de realidade, porém não posso aceitar que a questão sobre o que surgiu primeiro, Ser Humano ou Cultura, seja insolúvel e paradoxal tal como a velha questão Ovogalinácea.
Falo sobre os paradoxos que confundem a Causa com o Efeito, que abordarei mais adiante. Minha intenção é escapar dessas armadilhas, não por obrigação ou por achar que a questão seja fácil, mas por notar que parece haver um movimento inconsciente, fruto da massacrante lavagem mental que milhares de anos de pensamento teológico imprimiram na humanidade, ou mesmo dissimulada sob um misterioso intuito de determinismo cultural, que induz os pensadores humanos a se apartarem de adentrar certos terrenos de investigação como se estes fossem territórios sagrados do inominável, impensável e antinômico, da mesma forma como antes o faziam os teólogos perante questões para as quais a Bíblia não tinha resposta.
Apelo para a Biologia, para os elementos físicos do comportamento animal do qual como seres humanos ainda somos influenciados. Minha proposição pode ser resumida em afirmar que na realidade nosso comportamento como espécie, nível macro, ainda é muito mais determinado biologicamente do que pensamos, e que apesar da indiscutível força modeladora da cultura ainda operamos, como macro organismo coletivo, mais sob a força das diretrizes instintivas naturais do que sob os ditames culturais.

A FORÇA NATURAL

Como qualquer espécie sexuada os seres humanos possuem fortíssimos instintos que orientam suas condutas com relação a sobrevivência individual e a perpetuação da espécie. Ainda que como indivíduos humanos possamos transcender ou reverter esses impulsos, a maioria de nós, tanto em número quanto em grau, ainda obedece aos ditames dos instintos.
Não acredito em qualquer inteligência instintiva, considero os instintos como regras neurológicas puramente mecânicas sem qualquer possibilidade de contribuírem para nosso desenvolvimento como seres humanos genuínos, bastando que para isso não se cometa o erro crasso, e a meu ver imperdoável, de se confundir Instinto com Intuição, coisa que os Norte-Americanos fazem muito mais do que nós.
O instinto consiste apenas em um programa comportamental inato que sugere o que deve ser feito para se aplacar um mal-estar, e buscar um bem-estar. Apenas isso. Uma instrução primária que orienta o animal no sentido de mover-se numa linha unidimensional entre Prazer e Dor, em direção à primeira.
É o mal-estar da fome que impulsiona o animal a buscar alimento, o desejo de obter prazer que direciona no sentido de buscar o ato sexual. A Natureza não ofertou de modo inato a ser algum a noção de qual seria a finalidade destes comportamentos. Não existe uma noção de que ingerir o alimento cumpre uma função metabólica, ou de que o desejo sexual vise a perpetuação da espécie, ela apenas determina os instintos, mas os motivos por trás dos mesmos, não são acessíveis a qualquer dom decididamente natural.
É nesse sentido que compreendo ser irresistível querer ver uma inteligência oculta por trás de tudo, mas sem entrar no mérito da questão vamos apenas considerar que mesmo nós, homo sapiens, não nascemos com qualquer dom consciencial inato que nos diga qual é o sentido de nossos atos motivados pelos instintos, esse sentido é dado sem sombra de dúvida pela cultura, por nossa formação trans-natural. Nós apenas temos o potencial para, se recebermos estruturas simbólicas suficientes, desenvolver nossos dons humanos e nos tornarmos capazes de superar o estado animal que nosso legado biológico nos ofertou.
Não obstante os instintos continuam nos impulsionando, porém na condição de humanos nós não nos limitamos a dar-lhes significados, nos queremos nos apropriar de sua própria origem, e queremos nos ver como seres puramente autônomos, que agimos por uma pura vontade própria, ou de nossa própria cultura, ou de algo superior.
Nós reinterpretamos os direcionamentos instintivos de acordo com nosso grau de compreensão dos mesmos, e é nesse sentido que proponho a chave da resposta que pretendo dar para a questão colocada, e que é o fundamento de toda uma teoria que venho desenvolvendo há algum tempo.
A chave é: CRESCEI E MULTIPLICAI!!!

CRESCEI E MULTIPLICAI!!!

É sabido que os seres humanos perambularam milênios sobre a Terra antes de descobrir a associação entre o ato sexual e a reprodução. Nenhum animal vem equipado com uma noção de que uma coisa leva à outra, mas apenas com um impulso pela busca do prazer, e posteriormente como uma série mais complexa de impulsos que constroem as atividades maternais e de criação da prole.
Difícil saber quando e como ocorreu essa brilhante descoberta, que só os homo sapiens e sua habilidades mentais superiores poderiam fazer. Não tenho dúvidas de que tal relação causal entre o ato sexual e a reprodução foi um divisor de águas na história da humanidade, de que quando essa constatação foi feita mudanças drásticas ocorreram no grupamento humano em questão.
Milhares de anos depois nos já teríamos nos apropriado dessa noção e de seu impulso sexual de modo a torna-la algo mais "nosso", um exemplo é que chegamos a afirmar num dado momento que isso foi uma determinação de nossos deuses. Nós nos reproduzimos porque Deus nos ordenou, e aqui está uma das melhores Máscaras da Natureza, parodiando Joseph Campbell.
Mas continuamos inconscientes com relação a inúmeros aspectos do processo, provavelmente porque travestir instintos de deuses não seja uma forma muito esclarecedora de compreender a questão. Sendo assim, continuamos a agir sob o impulso dos instintos, mas sempre atribuindo-os a outros fatores, como as divindades ou outras forças culturais.
E finalmente, após essa introdução, respondo porque ao longo da história registrada as mulheres estiveram condenadas à submissão e ao secundarismo. A resposta a meu ver e extremamente simples:

Porque essa era a melhor opção em termos reprodutórios!

Sim. Como cultura num estado primário ao mesmo tempo que espécie num estágio ainda incipiente de disseminação populacional, uma sociedade Androcentrista é mais eficiente no sentido reprodutório, ela cresce mais rápido. Um grupo de um homem e 9 mulheres podem povoar um ambiente em muito menos tempo do que o inverso.
As fêmeas, incluindo as mulheres, são responsáveis pela grande maioria dos encargos reprodutórios, e sendo assim quanto mais elas se dedicarem exclusivamente a isso, e às atividades correlatas, mais rápido a população cresce. Uma mulher que se dedique à tarefas culturais, ou que foram tidas como exclusivamente masculinas, e se afaste de suas obrigações domésticas, que tenha mais autonomia e poder próprio de decisão, tende, em geral, a cumprir menos o papel de mãe em termos de quantidade.
Um mulher que tenha liberdade para decidir-se ou não ao papel de reprodutora, recusando casamentos, usando métodos contraceptivos, ou simplesmente reduzindo o tempo de sua disponibilidade passiva ao ato sexual por estar incumbida de outras tarefas, é menos reprodutivamente interessante em termos de dinâmica de macro-espécie.
Proponho que nunca as sociedades humanas assumiram claramente que seus sistemas androcráticos se devessem a isso, elas sempre inventaram discursos religiosos ou políticos para justificar a submissão das mulheres, não obstante é fácil observar que a humanidade parece ter reagido a essa dinâmica populacional inconsciente com incrível precisão.
De algum modo a macro espécie "sente" quando as condições populacionais estão mais ou menos satisfatórias. Uma vez que já ocorra a associação causal entre ato sexual e gravidez, e que haja muito território disponível, a tendência é a espécie se multiplicar o mais rápido possível, e dessa forma de um modo ou de outro os cruzamentos e a reprodução serão incentivados, quer seja numa plausível sociedade "matriarcal" onde as mulheres tenham liberdade de escolha de parceiros e não haja grandes tabus sexuais, ou numa sociedade "patriarcal" onde elas são simplesmente submetidas ao sexo. Estas últimas, que prefiro chamar de Androcráticas, tendem a se reproduzir mais rápido pois as mulheres perdem o direito de escolha, ao mesmo tempo que tentam manter as linhagens de propriedade masculinas, que só podiam ser observadas mediante o controle direto sobre as mulheres, pois o homem não tem a mesma certeza de progenitude que a mulher.
A medida que a população vai crescendo e se tornando excessiva, começam a surgir fenômenos culturais novos, que visam a desaceleração da reprodução. Normalmente o único modo de controle populacional ofertado pela Natureza é o extermínio de indivíduos, quer seja por intermédio de outras espécies competidoras ou pelo conflito interno na mesma espécie, o que diz mais respeito à espécie humana por não haver outras espécies animais macroscópicas que lhe façam frente, de modo que o único regulador populacional inter espécie que funciona contra a humanidade são os micro organismos. Portanto a guerra será o principal meio natural de se promover algum freio populacional, não de forma semi consciente ou de modo a existir uma tendência pró-guerra com o intuito deliberado de redução de população, mas apenas por que o excesso populacional gera tensão crescente, competição entre indivíduos, que se intensifica até estourar em movimentos sociais violentos.
Porém, no que se refere à macro espécie e num contexto temporal mais amplo, as guerras não servem como regulador populacional, pois produzem apenas uma redução temporária imediatamente compensada por posteriores explosões demográficas que sociedades com menor número de homens em relação às mulheres tende a produzir. Não a toa o estupro e apropriação em massa das mulheres das nações derrotadas são regra geral em qualquer guerra da antiguidade.
As primeiras situações de tensão populacional graves no velho mundo aparecem por volta da idade média, justamente quando o discurso moralista surge de modo a tentar restringir o ato sexual a um contexto matrimonial, e gerar uma série de preceitos que visam refrear os impulsos sexuais. É a partir daí também que surgem, além das constantes guerras, movimentos culturais completamente inéditos, que pregam o celibato em maior escala. Porém isso nunca será numericamente significante para deter os impulso natural que leva as populações a crescer, o que leva a mais e mais guerras, com suas breves reduções populacionais e consequentes compensações por "baby booms", e a ocorrência regular de doenças em larga escala.
Voltando mais diretamente à questão da mulher, pode-se notar o modo como ela é mais ou menos valorizada, e como o é, de acordo com a situação populacional. Em contextos onde o crescimento demográfico será liberado, e em sociedades androcráticas, as mulheres tendem a possuir muito valor como mercadoria. Os antigos hebreus por exemplo, como podemos constatar nos antigos textos da Bíblia, embora controlassem e submetessem suas mulheres, as tinham em alta cotação como reprodutoras, e o pai que possuísse filhas atraentes conseguia vendê-las por boas quantias em dinheiro.
Já em contextos onde o crescimento populacional se torna problemático, a tendência é as mulheres passarem a perder esse valor, além da já culturalmente construída desvalorização humana. Na Índia por exemplo, onde a população atingiu níveis insustentáveis, é onde ocorre atualmente a maior desvalorização feminina, onde ao contrário das situaçãos favoráveis ao crescimento, as mulheres não tem valor nem mesmo como mercadoria reprodutória, e portanto o infanticídio seletivo é largamente aplicado. Situação similar ocorreu na China, atualmente atenuada graças ao rígido programa de redução populacional imposto pelo governo.
Enquanto isso no ocidente atingimos um nível de dignificação feminina sem paralelo na história, a não ser talvez possíveis paraísos perdidos nas areias do espaço tempo. Onde o valor feminino é dado não apenas pelo seu potencial reprodutório, mas pelo seu potencial humano.
Não por acaso essas mulheres terão muito mais poder de decisão em reproduzir ou não, uma vez que agora seu valor como indivíduos humanos está demonstrado, ainda que estejamos marcados por uma série de heranças culturais que persistem em suas conotações arcaicas e pseudo-moralistas.
Os mecanismos que nos trouxeram até este estado são demais para seres discutidos aqui, mas espero que fique claro que atualmente o problema populacional está sendo pela primeira vez amplamente percebido e discutido, e que a urgência de se reduzir a explosão demográfica está clara, e que os únicos grupos sociais que se levantam contra tais tendências são justamente os baseados em visões de mundo antigas.
Esse quadro é favorável à que as mulheres se ocupem de outras funções que não as meramente reprodutórias, melhorado ainda mais pela integração contemporânea da metade feminina de nossa espécie ao conceito de humanidade.

Hoje em dia estamos numa espécie de encruzilhada, não inédita, mas cujas conseqüências, graças a nossa população recorde e nossos recursos tecnológicos, podem ser terminais. É na verdade a velha encruzilhada entre as dimensões existenciais de nossa espécie, a biológico, instintiva e herdada, e, a verdadeiramente humana.
Embora não possamos negar nossa origem, e do fato de que nossos instintos nos são úteis e bem vindos, o que nos faz humanos é exatamente a transcendência dessa bagagem natural evolutiva, rumo a um estado mental mais esclarecido. Neste estado, espero, é que obteremos os meios de dirigir nosso próprio destino no universo, obtendo respostas que a natureza em seu estado primitivo não pode nos dar.
A natureza nada tem a nos dizer sobre Ética, Espiritualidade, Compaixão, Amor ou qualquer valor que só faz sentido para o Ser Humano. Para a natureza não importa que milhares de crianças morram de fome se a espécie for preservada e continuar se multiplicando. Isso só incomoda à nossa condição humana.
É essa condição humana que nos permite não só contemplar e admirar o mundo, mas nos assustar e nos indignar. Repudio extremamente os discursos contraditórios em essência que menosprezam o valor do Ser Humano principalmente rebaixando-o perante hipotéticas entidades superiores, ou que chegam a pregar o auto extermínio de nossa espécie.
Até se prove o contrário a raça humana é a única coisa que faz sentido no Universo, que é capaz de achar um sentido para si própria e para o próprio Universo. Nesse sentido sou antropocêntrico, inclusive teleologicamente. Acredito que desde o instante primeiro do Universo, o surgimento de seres conscientes eram sua finalidade.
Sem o Ser Humano, ou equivalentes seres conscientes, o Universo é Inútil!

Já é um grande avanço na conquista desta plena humanidade que tenhamos atingido um estágio onde finalmente reconhecemos o valor humano do lado feminino da humanidade, de metade da humanidade, embora metade do mundo ainda não tenha atingido o mesmo incipiente estágio.
Existem Filósofas? Sim. Claro. Existem seres humanos de dois sexos, e a raça humana, em seu sentido verdadeiramente humano de existência só é completa com suas duas metades.

A CAUSA E O EFEITO

É justo agora trazer para o presente texto a justificação argumentativa para minha proposição de que "Todo Pensamento é uma Relação de Causa e Efeito".
Antes porém, gostaria de colocar uma opinião pessoal similar a algo dito pelo professor Guy. Considero que não existe discordância de conceitos, mas sim de termos, quando duas pessoas não concordam com alguma proposição, isso não se dá na realidade pelas formas distintas como concebem certas coisas, mas sim pelo modo como as traduzem para o meio externo.
Nesse sentido, se alguém conseguisse comunicar a outrem com exatidão a maneira como concebe algo, não haveria possibilidade de discordância, pois em última instância a Mente humana possui universais funcionais que permitem nossa identificação, haja visto que os pressupostos lógicos básicos não podem ser negados por qualquer pessoa sã.
Portanto, nossas divergências não estão em nossos "processadores mentais primários", tão pouco em nossas estruturas operacionais fundamentais ou em nossos símbolos internos. Toda a divergência se dá no âmbito do modo como traduzimos isso para o plano de linguagem, e toda discussão é, no fundo, uma tentativa de fazer o outro adotar o código representativo que estamos usando.
Em um grau mais superficial isso me pareceu ocorrer também quando propus minha idéia de Causa e Efeito como base de todo o pensar humano, portanto a primeira coisa a se fazer e explicar o que estou entendendo como Causa e Efeito, que sem dúvida apresenta uma conotação mais ampla do que pude perceber em sala de aula quando expus esta idéia.

O Universo é repleto de fenômenos, ou mesmo, é a simples totalidade de eventos que ocorrem num tempo-espaço nos mais variados níveis. Nenhum destes fenômenos ocorre isoladamente, portanto eles se relacionam.
Podemos considerar então que numa relação de fenômenos alguns tenham propriedades de Causa e outros de Efeito, ou haja uma reflexão, uma interação mútua. Esses mesmos "pares" de eventos também jamais estão isolados mas sim interagindo com toda uma gama de eventos periféricos, e numa visão mais holística, estão na realidade interagindo com todos os outros fenômenos do Universo.
Não há Efeito sem Causa, ou seja, eventos que não tenham como precedentes outros eventos, nem mesmo Causa sem Efeito, ou melhor, eventos que não desencadeiem outros eventos, ou se existem não poderemos percebe-los, pois a própria percepção dos mesmos já seria uma de suas conseqüências, um de seus efeitos.
Estendo o mesmo raciocínio aos processos mentais quaisquer que sejam suas naturezas. Do ponto de vista neurológico por exemplo é justificado, pois os processos eletroquímicos cerebrais são eventos físicos completamente regidos pelas leis da natureza. Já pensando "empiristicamente", podemos dizer que todos os nossos processos mentais são baseados em percepções da realidade, e mesmo considerando uma mente completamente metafísica, tais processos são encadeados, um pensamento gera outro, eles se relacionam e se interdependem num continuum extenso e indefinido.
Esse é o primeiro ponto. Nesse sentido, todo o pensamento é uma relação, e toda relação pressupõe influência causal ainda que sutil. Todos os eventos ao interagirem influenciam-se, e embora nem sempre seja possível afirmar quem é a Causa e quem é o Efeito, a relação é intrínseca.
Mas vou ainda mais além em meu segundo ponto, que muitos podem identificar como influenciado pelo empirismo inglês mas que quero crer ter sido uma elaboração pessoal convergente. Aprendemos a pensar baseado em nossas percepções, a maioria de nós pensa de forma muito visual, toda a nossa arquitetura mental parece se apoiar, ou se traduzir, em íntimas analogias com o mundo físico ainda que de modo muito simbólico.
Toda percepção é também relação de causa e efeito, no caso podemos afirmar que são efeitos das causas físicas do mundo. Portanto o próprio desenvolvimento do pensamento só é possível baseando-se no relacionamento de fenômenos.
Desafiei meus colegas e nossa professora a citar um exemplo de algum pensamento para que eu tentasse demonstrar sua natureza como relação de causa e efeito. Infelizmente não foi possível dar prosseguimento ao raciocínio dado os múltiplos desvios de assunto que ocorreram simultaneamente, mas me lembro bem do exemplo citado.
"Os olhos dele são azuis como as ondas do mar"
Ou algo muito parecido.
Well... Para mim este exemplo é ótimo! Primeiro vamos nos lembrar da afirmação, de que "todo o pensamento é uma Relação de Causa e Efeito". Portanto vejamos que pensamento pode estar por trás desta frase.
Evidentemente essa frase faz algum sentido, ela foi obtida após um processamento mental, não é um simples amontoado aleatório de termos, o que até um papagaio poderia fazer. Portanto pressupõe um pensamento, e é esse pensamento que deve ser examinado.
Há uma clara relação entre a "cor dos olhos" de alguém e a "cor das ondas do mar", podemos extrair que o que está a conectar essas duas idéias é a "cor Azul", ou verde.
É evidente que não é a Cor dos Olhos que causa a Cor do Mar e vice versa, não se trata deste tipo de relação, mas sim que relações mentais foram usadas para permitir esse pensamento.
A visão dos olhos de uma pessoa desencadeou a percepção de azul, portanto já temos um evento causal onde o efeito foi a informação de cor apreendida pela mente. O mesmo se dá na tonalidade da água do mar. Para ambos os casos podemos detectar relações entre os fenômenos, portanto, o que permite a frase é a relação de dois fenômenos através de um terceiro fenômeno correlato que lhes é comum.
Portanto, temos duas causas, o Mar e os Olhos, sendo relacionados através de um de seus efeitos, a percepção de Azul. Ou seja, o que permitiu o pensamento responsável por essa frase foram, em primeira instância, as relações sensoriais que ao desencadearem percepções permitiram que estas fossem relacionadas entre si.
Daí já podemos afirmar que o pensamento só foi possível através de relações de causa e efeito, que para haver algum sentido, os fenômenos a que se refere devem se relacionar de alguma forma.
Isso ocorre com qualquer manifestação mental humana que possamos considerar como pensamento, algo que faça algum sentido, que possa ser comunicado a nossos semelhantes. Não me refiro aqui a outras atividades mentais que possam ter sua natureza posta em cheque como atividades racionais. Por outro lado não me refiro apenas ao pensamento racional. Digo que mesmo o pensar poético, onírico ou simbólico estabelece relações entre eventos, e que tais relações só são possíveis porque de algum modo elas são relacionáveis causalmente. Todo e qualquer discurso ou idéia que nos for apresentada só será compreensível se os elementos que contiver puderem ser relacionados com alguma coerência, e é a essa coerência que digo estar implícita uma relação de Causa e Efeito.
Em segunda instância, temos que a frase estabelece uma comparação entre dois fenômenos, por que tal comparação? Em que ela é válida e o que ela desencadeia como pensamento respondente?
Digo que sua escolha não sendo aleatória, ela pressupunha algum sentido, assim como cumpria um certo objetivo, o de contestar minha proposição, ou seja, seria algo com a intenção de desencadear como evento a refutação de uma idéia.
A única forma de escapar do pensamento causualístico, de elaborar um "pensar" que não tivesse uma relação causal imanente seria uma expressão puramente aleatória de termos, e a psicologia já nos demonstrou que temos muito mais dificuldade em "pensar" aleatoriamente do que acreditamos, pois é possível uma série de leituras inconscientes por vezes reveladoras perante uma seqüência aparentemente aleatória de palavras. Além do que, mesmo se nos depararmos com uma seqüência realmente aleatória, nossa atividade mental imediata é tentar ver algum sentido naquelas palavras, encadeá-las de modo causal, ainda que tal encadeamento seja o que chamamos de subjetivo ela fará algum sentido ao nosso inconsciente, nos terá algum significado.

Por fim, é nesse sentido que entendo o Pensamento, mais especificamente o pensamento que pode ser descrito, que é comunicável a outros seres humanos e pode ser portanto constatado. Se há outras formas diversas de pensar, elas não me parecem perceptíveis claramente para nós mesmos, e são certamente incomunicáveis aos outros.
Todo pensamento é uma relação de fenômenos, que cumpre funções de causa e efeito.

FINALIZANDO

Espero ter então dado minha resposta para a questão título desta Disciplina, assim como explanar sobre o que entendo como Filosofia, e parte de sua prática, também como ter apresentado uma breve auto biografia ainda que não requisitada.
A isso adicionado também a questão da Causa e Efeito, espero compensar a ausência intencional de uma explanação mais elaborada sobre as apresentações dos professores, mesmo porque não me disponho a fazer relatórios a não ser dos pontos que me interessem mais diretamente, e espero que as regulares inserções de parte do que foi dito pelos mesmos ao longo de momentos relacionados do texto sirvam para que esse item não tenha sido por completo ignorado.
Para mim qualquer um dos assuntos aqui desenvolvidos nem se aproximou de um esgotamento, talvez mais pela minha ânsia em me aventurar nos labirínticos caminhos da racionalidade do que mesmo pela necessidade da questão em si.
De qualquer modo fica aqui minha apresentação. Outros textos de minha autoria podem ser visto na Internet, em meu site www.xr.pro.br , ou em outros locais acessíveis pela maioria dos sites de busca bastando para isso digitar "Marcus Valerio XR".

Agradeço a paciência de todos os que tiverem lido este texto.

Amigavelmente

Marcus Valerio XR
FREE MIND!!!


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