Transcrevo aqui a versão em Português da Declaração Universal dos Direitos Humanos e ao final alguns comentários de minha autoria.

Foram necessários mais de 5.000 anos de história registrada, com milhares de guerras, sistemas opressivos, escravidão, genocídios, guerras santas, repressão hedionda, tortura, destruição em massa, e também infindáveis lutas pela liberdade, surgimento da Imprensa, Revolução Francesa, Revolução Industrial, e finalmente uma Guerra Mundial onde foi inaugurado o terror nuclear, para que a Humanidade chegasse a uma conclusão razoavelmente consensual de que deveria se entender, dando o primeiro passo no sentido de harmonizar os povos e o mundo. E finalmente foi promulgada em 10 de Dezembro de 1948 pela recém criada Organização das Nações Unidas a seguinte obra.

Marcus Valerio XR

Declaração Universal dos Direitos Humanos

Preâmbulo

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;

Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos humanos conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração humanos;

Considerando que é essencial a proteção dos direitos humanos através de um regime de direito, para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão;

Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais humanos, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;

Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais;

Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:

A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os orgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.

Artigo I

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

Artigo II

Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania.

Artigo III

Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo IV

Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.

Artigo V

Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Artigo VI

Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica.

Artigo VII

Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

Artigo VIII

Toda a pessoa direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei.

Artigo IX

Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.

Artigo X

Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida.

Artigo XI

1.Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.

2.Ninguém será condenado por ações ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam ato delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o ato delituoso foi cometido.

Artigo XII

Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei.

Artigo XIII

1.Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado.

2.Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país.

Artigo XIV

1.Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países.

2.Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por atividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas.

Artigo XV

1.Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade.

2.Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade.

Artigo XVI

1.A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais.

2.O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos.

3.A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado.

Artigo XVII

1.Toda a pessoa, individual ou coletiva, tem direito à propriedade.

2.Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade.

Artigo XVIII

Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.

Artigo XIX

Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão.

Artigo XX

1.Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas.

2.Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

Artigo XXI

1.Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direção dos negócios, públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos.

2.Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país.

3.A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.

Artigo XXII

Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país.

Artigo XXIII

1.Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego.

2.Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.

3.Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.

4.Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.

Artigo XXIV

Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas.

Artigo XXV

1.Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade.

2.A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma proteção social.

Artigo XXVI

1.Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito.

2.A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.

3.Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o gênero de educação a dar aos filhos.

 

Artigo XXVII

1.Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam.

2.Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.

Artigo XXVIII

Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração.

Artigo XXIX

1.O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade.

2.No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática.

3.Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente e aos fins e aos princípios das Nações Unidas.

Artigo XXX

Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma atividade ou de praticar algum ato destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.

 

O Que Penso Sobre Isto?

Não há nenhuma Religião tradicional em toda a história que tenha se aproximado do desenvolvimento de uma declaração como essa, em qualquer um dos grandes livros sagrados monoteístas, nem mesmo a mais ousada acrobacia teológica conseguiria produzir uma interpretação que resultasse numa obra humanista onde tal conteúdo tivesse base plena nos ensinamentos religiosos desta mesmas revelações divinas.

Ao abolir a influência direta da Religião sobre a Política, tornou-se possível desenvolver um documento que expressasse o desejo humano de se relacionar com seu semelhante de forma harmônica e pacífica.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos é algo absolutamente sem paralelo em toda a história humana. Jamais em qualquer época anterior existiu em escala significativa, sequer uma intenção de declarar a Igualdade e Fraternidade entre os povos e indivíduos. Na verdade, querer fazer valer os mesmo direitos e deveres para qualquer Ser Humano independente de sexo, raça, nacionalidade, credo e etc., era algo simplesmente INCONCEBÍVEL para todos os sistemas sociais antigos registrados na História.

 

Lamentavelmente, ainda estamos muito longe de fazer valer sequer a metade dos objetivos expressos nesta declaração, mas pelo menos demos um passo ainda que teórico, lembrando que todas as grandes mudanças começam na teoria. Mais de 200 países atualmente pelo menos tentam basear suas constituições civis nesta Declaração.

Em minha opinião essa declaração é perfeita! Mostra que foi pelo menos idealizado em larga escala um objetivo de alto grau moral, ético e espiritual. A meu ver, pessoas que atacam os valores desta declaração ainda estão presas a uma visão de que a estratificação social e dominação opressiva de um indivíduo pelo outro é a melhor resposta para os problemas humanos.

Outros criticam justamente a falta de maior aplicação nos sentido de por em prática tais valores, mas há também aqueles que levantam um questionamento notável, mas que na realidade não passa de uma falácia. Trata-se de que deveria ser proposta também a Declaração Universal dos DEVERES Humanos.

Tomo como exemplo uma interessante crítica feita a um de meus textos:

... possuímos uma Declaração Universal dos Direitos Humanos, cuja validade prática é questionada hoje até por seus criadores. José Saramago, nas comemorações da citada Declaração, cita justamente a sua falta de prática e a necessidade de que os homens se conscientizem de sua contrapartida, os deveres humanos, sem os quais ela é inútil...

E minha resposta foi:

"Quanto a argumentação de que a Declaração Universal dos Direitos Humanos é questionável, considero a proposição reacionária. Com certeza, cada direito deverá se contrapor a um dever, mas ao longo da história as maiorias sempre tiveram muito mais deveres do que direitos! Ao passo que as elites muito mais direitos.

Quando uma criança nasce ela não tem condições de cumprir deveres, precisa primeiro ter direitos. Mesmo atualmente um número imenso de crianças no mundo, sequer tem direito ao básico, como podemos exigir que cumpram seus deveres? A Declaração vêm tentar preencher esse espaço, ela pode ter seus problemas, mas me impressiona que alguém se proponha a atacar seus princípio básicos."

Ou seja, embora seja válida a proposição de contrapor direitos e deveres, creio que isto está no mínimo implícito em toda a declaração, pois é impossível estabelecer direitos sem alguém que os faça valer. Vejamos alguns exemplos:

"Artigo I

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

Artigo XXI

3.A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.

Artigo XXVI

1.Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito.

2.A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.

Artigo XXIX

1.O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade.

2.No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática."

Quem imaginaria que para que tais direitos valham a sociedade não tem o dever de se mobilizar no sentido de cumprí-los?

Em meu ponto de vista, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma obra de avançado grau de esclarecimento mental e comprometimento humanitário.

Pelo menos para mim, ela mostra que consensualmente a humanidade já sabe mais o que quer, ainda que não consiga realizá-lo. Mostra que ao menos em Teoria, estamos melhor do que nunca.

Afinal, se hoje declaramos algo tão teoricamente nobre mas falhamos em pô-lo em prática, antes nem sequer tínhamos a teoria.

 

Marcus Valerio XR
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