Esta monografia foi realizada como tarefa de avaliação da disciplina acadêmica de Cultura Japonesa 1 do Curso de Licenciatura em Língua Japonesa da Universidade de Brasília Departamento de Letras - Tradução, sob a orientação da professora Donatella Natilli em Junho/Julho de 1999.
Como tal, seu direcionamento seria meramente de exercício pedagógico, entretanto seu autor possuí outras pretensões de cunho cultural tendo como algumas das prioritárias as áreas de Filosofia, Religiologia e Psicologia. Dessa forma tal trabalho excede o objetivo original, possuindo não só um objetivo de mera pesquisa mas sobretudo de reflexão e especulação.
Sendo um material redigido sob condições pouco ideais de disponibilidade de tempo, fontes bibliográficas e devido a inexperiência do autor nesse campo, é natural que contenha falhas a serem corrigidas e muitos aspectos que exijam aperfeiçoamento.
O autor não a considera de forma alguma terminada, tendo intenção de sempre que possível melhorá-la, e ficaria muito agradecido a qualquer colaboração por parte de interessados no assunto.

Marcus Valerio XR
Julho de 1999

Pois aqui está, FINALMENTE, a "finalização", em:
O XINTOÍSMO E A INDENTIDADE CULTURAL DO JAPÃO.
Ou, melhor dizendo, trata-se de um aperfeiçoamento do tema, com uma visão crítica, e não meramente pedagógica, como este texto original. Abordagem didática esta que, atualmente, não é mais necessária, visto a proliferação de textos pela web sobre o tema, totalmente ausentes na época em que lancei esse escrito abaixo, e muitos dos quais claramente baseados, se não plagiados, desta minha primeira abordagem do tema.
Assim, fica neste NOVO TEXTO concluída essa breve e preliminar dissertação.

Marcus Valerio XR
2 de Julho de 2008

XINTOÍSMO

A Religião Japonesa

Universidade de Brasília, Junho/Julho de 1999, Departamento de Letras - Tradução, Curso de Licenciatura em Língua Japonesa, Disciplina: Cultura Japonesa 1, Professora: Donatella Natili

SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO

2 - O QUE É O XINTOÍSMO

3 - AS BASES MITOLÓGICAS

4 - CARACTERÍSTICAS

5 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA

6 - O XINTOÍSMO MODERNO

7 - REFLEXÃO

8 - CONCLUSÃO

9 - BIBLIOGRAFIA

INTRODUÇÃO

Certa vez estive a discutir com alguns colegas, sobre alguma característica que pudesse ser considerada genuína e exclusivamente humana, algo que pudesse caracterizar uma indiscutível natureza do Homo sapiens.

Obviamente funções fisiológicas, sociais e emocionais primárias foram descartadas uma vez que a maioria dos animais superiores também as possuem. Tão pouco é válido alegar alguma atitude que dependa da tecnologia.

Muitas questões mais profundas sobre o sentimento, a linguística ou o pensamento caem num campo de discussão filosófica sem muita possibilidade de conclusão, a não ser algumas exceções como a linguagem transmitida tendo o indivíduo como vetor.

Não é uma questão fácil de se resolver, tanto que dificilmente chegar-se-á a qualquer conclusão sem se apelar para recursos especulativos. Mas evidentemente esses mesmos recursos de pensamento nos permitem pelo menos tirar algumas conclusões e opiniões razoavelmente apropriadas.

Em minha opinião uma característica exclusivamente humana é a mística, o comportamento de sentir e acreditar em algo que não é perceptível aos sentidos, dedutível racionalmente ou mesmo claro emocionalmente. Jamais em toda a história da Antropologia foi detectado um grupo humano que, independente de seu estado técnico ou social, não acredite em algum tipo de mito.

Mesmo com muitas divergências, a intuição de que existe algo além do que vemos à nossa volta é um elemento poderoso da psique humana, que influencia, constrói ou mesmo governa completamente nossas vidas.

Não há culturas atéicas embora indivíduos isolados o possam ser ocasionalmente. Na realidade, chego até a ousar dizer que não existe alguém verdadeiramente ateu, se consideramos a raiz etimológica DEUS/THEOS pelo seu significado original grego, que significa "algo invisível".

Todos temos nossas próprias convicções mas sempre acreditamos em algo "invisível", além de nossa percepção sensorial. Mesmo o mais cético dos cientistas acredita em algum princípio fundamental da natureza que não pode ser completamente provado ou comprovado. Ou alguém seria presunçoso o suficiente para afirmar que domina com absoluta clareza todos os mistérios do universo?

A mística é uma natureza humana e uma constante em todas as culturas, dela se desmembra a mitologia, as crenças, as religiões e seitas, e por mais diversa das demais que seja uma sociedade, sua concepção mística possui elementos similares a qualquer outra, na verdade há unanimidades indiscutíveis.

Um princípio ativo criador ou uma entidade que é responsável pelo universo, leis ou fundamentos que regem tudo a nossa volta, de onde viemos antes de nascer e para onde iremos depois de morrer, são apenas algumas das constantes identificáveis entre as inúmeras culturas.

Para confirmar a regra da exceção, poderia citar entre vários outros exemplos, que um ou outro destes pode em determinada concepção mística-filosófica estar ausente em maior ou menor grau, mas no geral ocorre uma tendência que atribui a todas as crenças humanas um certa conformidade.

Parece também haver um certa hierarquia organizacional que determina a classificação de determinada concepção místico-filosófica nas categorias: Mitologia, crença, seita ou religião.

Uma mitologia é uma coleção de mitos interligados. Mito é popularmente considerado algo fantasioso, para alguns são histórias improváveis, lendas, e deploravelmente há até outros que o reduzem pura e simplesmente a bobagens "falsas", lembrando que é possível encontrar mesmo no meio acadêmico indivíduos que não sabem a diferença entre ficção e mentira.

Geralmente um panteão, uma mitologia sobrevive principalmente através de estórias podendo se transformar posteriormente em uma crença com caráter de seita ou religião.

Uma religião possui características classificantes tais como um messias, código de leis explícitas, livro sagrado, igrejas, ou intervenção social direta, sendo geralmente muito abrangente em seu meio. Se tal crença têm menor campo de atuação relegando-se a um segundo plano atrás de um religião dominante, ou falta-lhe qualquer dessas características, ela muitas vezes é taxada de seita, que por hábito tende a ser um termo pejorativo.

Das grandes crenças mundiais, apenas principalmente as monoteístas sempre se assumiram oficial e orgulhosamente como religiões, Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. É interessante como a maioria das outras não reclama o status de religião e se incomoda com o termo seita, mesmo que apresentem todas as características de uma.

As crenças orientais têm essa particularidade de não se intitularem e as vezes até evitarem sua identificação como uma religião.

Por quê "místico-filosófica"?

Filosofia é antes de mais nada a capacidade humana de pensar, avaliar, refletir, contemplar e procurar repostas de forma organizada. Etimologicamente é o "Amor(philo) à Sabedoria(sofia)

A mística é ao meu ver, um tipo de "resposta", intuição ou resultado que nos chega sem ser atingida pelo raciocínio, é quase sempre geralmente uma indução enquanto a filosofia tende a ser mais dedutiva.

Ambas se complementam em qualquer concepção teológica, pois se dá no sentido de princípios explicando fenômenos que analisados levam a princípios que resultam em fenômenos. É um ciclo.

A filosofia não pode ter limites para a busca de respostas mas se chega a uma barreira intransponível racionalmente atinge-se então uma característica mística, metafísica. A mística surge para tornar o incompreensível pelo menos aceitável.

Nesta Monografia, faremos um breve ensaio do XINTOÍSMO, uma religião que permite a reflexão de todos os apectos evolutivos de uma concepção místico-filosófica. A enfase está na crença mística em si, suas características principais e suas semelhanças e diferenças com outras crenças do ocidente e oriente.

O XINTOÍSMO

A única religião que pode ser considerada genuínamente japonesa, com origens que se confundem com a do próprio povo, há pelo menos dois milênios predomina na mística do arquipélago do país do sol nascente.

Demorou a receber essa denominação adaptada do chinês xin-tao, "via dos deuses", por volta do século XI, embora muitos japoneses utilizassem o termo nativo kami-no-michi, com o mesmo significado.

Diferente do Budismo, que têm origem indiana e influência chinesa, o Xintoísmo é dominante apenas em seu país de origem, embora sua prática não implique no abandono total ou repúdio a outras formas de crença. Não se trata de uma concepção exclusivista, convivendo pacificamente e até complementarmente com outras práticas religiosas.

Na verdade por muitos estudiosos nem chega a ser considerada uma religião devido a ausência de elementos como códigos de leis explícitas, filosofia textualmente definida, profetas ou um livro sagrado mais elaborado.

Entretanto a ostensividade da penetração do comportamento xintoísta na vida de seus praticantes, perceptível não só em seus diversos rituais mas em todos os aspectos da vida, bem como sua ampla abrangência em seu país de origem, garante a esta concepção místico-filosófica o estatuto de uma das grandes religiões do mundo.

Baseia-se numa mitologia panteísta com inúmeras divindades que atribuem valor sagrado a todos os elementos da natureza. Na verdade tudo no universo é divino para essa concepção, sendo interligado e interdependente de forma que não só os seres vivos, mas o vento e a água, as pedras, a montanha, e todos os níveis invisíveis da natureza, coexistem em harmonia tendo se originado da mesma fonte.

Nesse ponto se assemelha ao Taoísmo, e também quando diz que tudo é regido por forças de pureza hare, impureza ke, e a fusão de ambos kegare. Isso determina uma das mais importantes características do rituais xintoístas, a purificação de corpo e alma.

Outra característica forte é a harmonia com a natureza, o praticante busca se familiarizar e se integrar com a natureza num comportamento simbiótico, de onde ele tira seu sustento mas também deve retribuir. Dessa forma a sobrevivência depende do entendimento do ser humano com toda a estrutura vital a sua volta, considerando-a uma parceira e uma guia.

É oposta a muitas concepções ocidentais no qual o homem é adversário da natureza, lutando para dominá-la, subjugá-la. Na concepção Xintoísta, e oriental em geral, mesmo milênios antes de qualquer concepção ecológica, já se considera que o ser humano não pode viver em confronto com a natureza, o que é bastante interessante levando em consideração que as condições geográficas e climáticas do arquipélago japonês são sem dúvida uma das mais implacáveis do mundo, com grande número de vulcões ativos, terremotos intensos e furacões devastadores.

O estudo do Xintoísmo é vital para o entendimento da cultura japonesa, sua visão de mundo determina boa parte do comportamento nipônico, como sua capacidade de adaptação e absorção de novas idéias ao mesmo tempo que preserva as antigas, sua boa recepção a novas culturas e idéias, seu comportamento que valoriza a higiene e a saúde e seu sentimento de nacionalismo.

Mesmo se fundindo com outras religiões e se subdividindo em vários desdobramentos, o Xintoísmo deixa um legado que com certeza contribui para o receptividade dos japoneses, de forma que o exclusivismo principalmente religioso é pouco praticado no Japão.

Alías, é um lenda xintoísta que deu origem ao nome desta nação, que outrora fora chamada Yamato, de o país do sol nascente.

AS BASES MITOLÓGICAS

Como toda mitologia, o Xintoísmo também explica o surgimento do universo e assim como a grande maioria, considera que tudo teve origem de uma amorfia desordenada denominada CAOS.

Deste Caos separou-se o céu, duas forças fundamentais antagônicas, tais como o Ying e o Yang do Taoísmo, e 5 grandes deuses

As 5 grandes divindades saídas do CAOS são:

AMENOMINAKANUSHI

( Senhor do Nobre Centro Celestial)

TAKAMIMUSUBI

( Grande Gerador do Deus Prodigioso)

KAMIMUSUBI

( Divino Gerador do Deus Prodigioso)

UMASHIASHIKABIHIKOJI

( O Mais Velho Soberano do Cálamo)

AMENOTOKATACHI

(O Eternamente Deitado no Céu)

Deste último decorrem as 7 gerações divinas, dois seres completos e mais 5 casais:

KUMINOTOKATACHI

( Eternamente Deitado sobre a Terra)

TOYOKUMONU

( Senhor da Integração Exuberante)

UHIJINI

(Senhor da Lama da Terra)

&

SUHIJINI

( Senhora da Lama da Terra)

TSUNUGUHI

(Embrião que Integra)

&

IKUGUHI

( A que Integra a Vida)

OHOTONOJI

( O Mais Velho da Grande Morada)

&

OHOTONOBE

( A mais Velha da Grande Morada)

OMODARU

( Aspecto Perfeito)

&

AYAKASHIKONE

( Majestosa)

IZANAGI

( Varão que atrai)

&

IZANAMI

( Mulher que Atrai)

IZANAGI & IZANAMI são os seres criadores do arquipélago do Japão, no caso o mundo, e das inúmeras entidades secundárias, muitas das quais associadas a cada ilha.

Com a orientação dos deuses mais antigos e em poder da Lança Celeste modelam a massa disforme que era o mundo e dão origem a 10 filhos que representam elementos da natureza. São esses:

Divindade da ATMOSFERA

Divindade do VENTO

Divindade das ÁGUAS

Divindade dos PÂNTANOS

Divindade do OUTONO

Divindade das ÁRVORES

Divindade das MONTANHAS

Divindade do Barco de Cânfora

Deusa do ALIMENTO

Deus do FOGO

Após o último parto que levou IZANAMI a morte, IZANAGI revoltado decapta o Deus do FOGO, e do sangue jorrado surgem mais 16 deuses. Depois promove a descida aos infernos ou mundo dos mortos na tentativa de recuperar sua esposa. Com a qual entra em contato não visual.

Mas ela já tendo se integrado e comido da alimentação dos infernos a princípio não pode mais retornar, pedindo que IZANAGI a aguarde enquanto busca um meio entre as divindades regentes do inferno para que lhe seja permitida a volta. Ela o instruí a não se aproximar até segunda ordem, mas devido a demora IZANAGI ignora o pedido. Ao se deparar com o corpo putrefato de sua esposa é tomado de horror, e ela, revoltada com sua impaciência e sua reação, o persegue junto com espíritos infernais.

Ao retornar ao mundo dos vivos ele se banha em um rio para se lavar das impurezas dos infernos, realizando a Purificação, de seus trajes abandonados e das impurezas saídas de seu corpo nascem muitas divindades muitas das quais maléficas.

Depois, de seu olho esquerdo nasce a deusa solar AMATERASU e o do direito o deus lunar TSUKI, do nariz surge SUSANOWO que se torna imperador do oceano.

E a participação ativa de IZANAGI e IZANAMI terminam aqui, assim como a de qualquer outro dos deuses mais antigos, deixando entretando uma descendência de pelo menos 800 divindades.

AMATERASU, a deusa solar, é a grande mãe do povo japonês, sendo considerada a ancestral primeira de toda a descendência imperial japonesa. Tal crença será base de um importante comportamento nipônico que abrange o nacionalismo e a identidade cultural

Essa é uma das mais interessantes peculiaridades desta mitologia, diferente da grega, egípcia, Asteca, etc. O sol, é uma entidade feminina. Isso demonstra que algumas religiões orientais apresentam um ponto de vista diverso daquele que atribuí sempre ao Sol uma característica masculina, o que fecunda lançando seu semêm sobre a Terra, que possui característica feminina sendo o óvulo onde germina a vida. Tal concepção encontra correlação até mesmo científica, uma vez que toda a vida que nasce na Terra provêm e depende das emissões de energia do sol.

No entanto houve épocas em que não se conhecia o papel masculino na reprodução, nessa antiguidade eram mais comuns as deusas solares. Mas um fato ainda mais notável é que geralmente o Sol seja associado a divindades masculinas em locais mais quentes, Egito, Índia e América Central por exemplo, já em locais mais frios a associação com divindades feminas é maior. Provavelmente onde o Sol é mais agressivo, sobressái suas características masculinas, e as femininas predominam onde o Sol é mais associado a idéia de conforto, calor agradavel. Há exemplos na Escandinávia, Alemanha e América do Norte.

AMATERASU reinava no céu, e na Terra através de seus descendentes, no caso os imperadores. SUSANOWO, o masculino impetuoso, ambiciona mais que o reino do oceano e perturba a deusa solar em sua morada celestial. Entre outras coisas destrói os arrozais sagrados, bloqueia fontes de irrigação e suja o palácio da deusa. Indulgente, ela o perdoa até que sua ofensa se torna inaceitável, ele jogara um cavalo morto entra a deusa e suas serviçais tecelãs ferindo mortalmente muitas delas.

Amargurada ela se esconde numa caverna sagrada e toda a terra mergulha na mais profunda escuridão e catastrófes. Em desespero os 800 deuses precisam tomar uma providência, elegem o sábio OMOIKANE-NO-KAMI para convencer a deusa a voltar, uma vez que não se pode trazê-la a força.

Este então ordena a construção de um espelho místico e um colar de pérolas. Em frente a caverna faz um fogueira queimando o omoplata de um gamo, o que provoca estalos e fagulhas que formam desenhos, uma das mais antigas formas de advinhação japonesa praticada por feiticeiros. Traz um pinheiro do monte Kagu e deposita o espelho e o colar na parte de cima, na parte de baixo põe oferendas.

A deusa AME-NO-UZUME dança em frente a caverna com os seios a mostra, todos os deuses se reunem e passam a rir e a gritar como numa festividade. O objetivo era tentar dar a entender a AMATERASU que tudo estava bem e todos estavam felizes, como se não precisassem mais dela e tivessem uma nova deusa solar.

Intrigada ela sai da caverna para ver o que está acontecendo, os deuses postam o espelho em frente a seu rosto e ela pensa estar diante da nova deusa do sol, cada vez mais curiosoa ela sa afasta da caverna, os deuses então fecham a entrada com um corda de palha trançada, que até hoje significa a proibição de se entrar em locais sagrados.

Dessa forma o sol volta novamente a brilhar no mundo, SUSANOWO é "multado", tendo que pagar mil pranchas de oferendas e é banido para a terra na região do IZUMO, o "país tenebroso" que era um tipo de inferno.

Algumas versões da lenda dizem que ele se tornou um deus do mal em sofrimento, outras dizem que ele se arrependeu e passou a praticar o bem. Tais divergências são apenas um dos resultados de uma mitologia que sobreviveu por mais de um milênio sem nenhum registro escrito.

Como em quase todas as mitologias, ocorre uma "situação" de desavença entre as divindades. Na religiões bíblicas houve a guerra no céu entre o revoltoso LÚCIFER e o Pai Celestial. Na mitologia grega a guerra do Titãs quando ZEUS destronou CHRONOS, na egípicia houve a luta entre HÓRUS e SETH e assim prosseguem relatos semelhantes no MAHABARATA, nas lendas nórdicas, e em muitas religiões indígenas inclusive amazônicas.

O Xintoísmo entretanto tende a ser mais peculiar, pois nesse caso apesar dos episódios de IZANAGI e o Deus do FOGO, e de SUSANOWO e AMATERASU, não ocorre entretanto um guerra generalizada, assim como o Xintoísmo também não prevê detalhadamente um Apocalipse, Armageddon, Ragnarok, Mahapralaya ou Crepúsculo dos Deuses.

A punições aplicadas ao deus do oceano, são uma garantia dos deuses de que novas catástrofes cósmicas não mais se abaterão sobre os 3 mundos, o Céu a Terra e os Subterrâneos.

Dentre as inúmeras interpretações possíveis dos mitos, não só xintoístas mas de qualquer outra crença, torna-se muito interessante destacar pelo menos duas.

O ser humano possui em algum "momento" de sua psique primária a noção de que os deuses não possuem uma vida muito diferente da dos mortais. Dessa forma tentam explicar o universo, a gênese e a natureza em todos os níveis visíveis e invisíveis atribuindo estórias de caráter humano com personagens de comportamente humano.

De certa forma, o homem cria os deuses a sua imagem e semelhança.

Tal concepção só tende a desaparecer nas crenças mais "evoluídas" intelectualmente, geralmente absorvendo crenças antigas, aplicando-lhe interpretações mais racionais e contextualizando-as num plano maior a exemplo do que o Espiritismo Kardecista faz com o Cristianismo ou o Budismo faz com o próprio Xintoísmo.

Uma vez que todos os fatos históricos marcantes estão associados a perídodos perturbados mesmo nas mais primitivas sociedades, seria natural que um evento de importância tão absoluta tenha se caracterizado por movimentos agitados.

A agitação máxima desse tipo de visão, a razão primária de todas as coisas é o CAOS. Em quase todas as religiões ele surge como o princípio ativo criador. Intrigante é o fato de que muitas vezes o CAOS se confunde com o ÉTER, vazio. Em algumas crenças são coisas distintas e em outras são complementares e as vezes até a mesma entidade numa relação paradoxal de Ser e Não-Ser.

Muitos teólogos modernos gostam de ver a crença no princípio caótico do universo associado a teoria do BIG-BANG. Nesse caso antes da grande explosão teríamos o vazio, o ÉTER, e em seguida o CAOS, que é exatamente o que teria ocorrido de acordo com a física contemporânea.

Da caótica geração violenta de matéria que deu origem ao universo viria toda a criação.

No Xintô já havia a separação do céu em relação a terra, mas está estava na forma de CAOS, uma massa amorfa. IZANAGI e IZANAMI que através da Lança Celeste lograram a organização, "misturando" porções dessa massa que se tornaram as ilhas e deixando o restante na forma do mar.

A maioria das mitologias segue esse padrão, baseando-se na sua restrição de visão de universo, que os faz considerar apenas sua porção de mundo. A noção da esfericidade da Terra está além de sua visão de mundo inicial, fazendo-as inferir então sobre uma extensa horizontalidade não relativa, que separa Céu, Terra e se for o caso Subterrâneos.

A maioria das mitologias atualmente, após todas as descobertas científicas, reconhecem suas cosmogêneses principalmente numa forma simbólica, ou valorizando-as uma visão de época, não sofrendo então um choque cultural entre fé e ciência.

Outras tentam desesperadamente reinterpretá-las, buscando novas significâncias para termos que as tornariam atuais, pretendendo então conformá-las com os conhecimentos modernos ou em casos mais extremos até declará-los superiores.

O Xintoísmo opta pela primeira opção, nunca se defrontando então com o racionalismo ou cientificismo, reconhece tudo em sua visão de interdepêndencia usando-a como uma noção mais abrangente e se eximindo então de maiores contradições.

CARACTERÍSTICAS

( Esta parte ainda está por ser complementada )

OS KAMI

O termo japonês kami significa "algo elevado", "divino", "superior". Não existe tradução precisa mas o termo é atribuído aos espíritos sagrados, deuses e divindades em geral. Todos os elementos da natureza, seres vivos ou mesmo minerais possuem seus kami. Deve-se tomar cuidado por que o termo kami em japonês também pode siginificar "cabelo"ou "papel".

Por ser a mãe de toda a família japonesa e fundadora do Japão, AMATERASU é considerada como a mais elevada dos kami, deusa não só do Sol mas de toda a luz, claridade física e espiritual. O xintoísmo destaca como uma de suas máximas, a busca espiritual para a claridade, a pureza da luz.

Além das divindades mitológicas, muitos "ícones" também podem ser atribuídos a "kamis", como por exemplo um objeto sagrado, usado em ritos, ou o tesouro de determinada comunidade.

Pesonagens humanos que realizem grandes feitos, heróis, e o próprio imperador, descendente direto de AMATERASU, recebem veneração comparável a dos kami. No caso dos hérois o feito pode ser de qualquer ordem, militar, social ou artístico, podendo esta celebridade receber santuários. Mas lembremos que isso não significava torna-lo equivalente a um kami original, pois não se perde a noção do limite que o separa de um ser humano. Apesar disso na verdade o que se admira não é o personagem humano em si, mas sim a sua parte divina que o permitiu realizar o que quer que tenha feito.

Para o Xintô um deus pode soltar partes de sua própria essência que dará origem a novas entidades independentes, e muitas das "encarnações" dos deuses podem morrer, diferente por exemplo da maior parte das mitologias ocidentais.

IZANAMI, o Deus do FOGO e SUSANOWO são exemplos disso, mas isso não siginifica que estejam de fora do panteísmo, pois passam então a integrar exclusivamente o mundo espiritual. Muitos deuses tem túmulos identificados, onde se presta reverências.

O SER HUMANO

Descendentes dos deuses, os humanos são pela visão xintoísta, seres a princípio puros e bons tal como seus ancestrais. Não existe como no Cristianismo, o Pecado Original, que impregna todo o ser humano desde que nasce tendo que ser purificado pelo batismo da igreja. Ou a decadência de um estado superior, como foram as idades de Ouro, Prata, Bronze até chegar a idade do Ferro, como há na mitologia grega, seu correlativo Hindu e seus equivalentes Gnósticos, ou o estigma de um sofredor por natureza, como no caso do Budismo.

Quando um ser humano pratica o mal, ele está sobre influência do Yomi, a essência negativa do universo, através de suas entidades malignas e energias impuras. A ele resta então praticar a purificação e o reencamihamento a luz.

Para o Xintô, todo o pecado não passa de um sujeira temporária acumulada posteriormente, entretanto os que se entregam a maldade, cultivando-a e abnegando-se da purificação, invariavelmente serão punidos pelos Kamis.

Aquele que insiste na maldade acabará tendo por resultado o destino do mundo subterrâneo, os infernos, e talvez a incorporação ao Yomi. Mas no Xintoísmo não existe também o estigma da danação eterna, mesmo além do mundo físico a vida continuará, assim como foi com os deuses antigos, deixando sempre uma possibilidade de redenção.

A PUREZA

Quando o kami IZANAGI se banhou em um rio para se limpar das impurezas, deu origem ao mito da purificação. Segundo o Xintô, tudo na natureza é influenciado pela pureza e a impureza, principalmente o ser humano. Este deve então buscar a constante purificação com o objetivo da elevação espiritual, única maneria de se tornar merecedor da ajuda dos deuses.

Muitas atitudes da vida mundana mesmo as necessárias, implicam em impurezas, principalmente as associadas com o sangue. Matar animais ou outros seres humanos torna a pessoa impura, necessitando de um ritual de purificação. Até mesmo o parto e a mestruação feminina são períodos de impureza que faz necessária a prática constante da purificação.

Segundo o Xintô, todo o valor decorre da pureza, o ser humano só encontrará a verdadeira iluminação em seu estado puro. A vida na impureza conduz a desgraça e ao sofrimento, gera manchas que atraem espíritos malignos e desperta o repúdio e a ira dos deuses.

Existem básicamente 3 tipos de impurezas, "pecados", que podem envolver o ser humano.

Os WAZANAI são as desgraças, os infortúnios que se abatem sem culpa do indivíduo, mas os quais também precisam ser lavados.

Os KEGARI são as manchas em geral do dia a dia, a manipulação de cadáveres inclusive de animais, a sujeira pelo sangue, condutas levianas ou imprudentes.

Os TSUMI são os "pecados" propriamente ditos, as maldades cometidas deliberadamente.

Dessa forma há os 3 principais ritos de purificação

O HARAI promove a purificação do "pecados", TSUMI. O rito do HARAI se baseia na punição de SUSANOWO, com o qual guarda semelhanças como a oferta de oferendas.

O MISOGI faz a limpeza das impurezas obtidas não intencionalmente, manchas, os KEGARI. Também usado para purificar o ser humano das desgraças das quais ele pode ser vítima, WAZANAI, sendo esse ritual baseado no mito do banho de rio de IZANAGI.

O IMI é basicamente a abstinência de certas atitudes impuras, alimentos, bebidas, ou atividades que resultem em impurezas pelo menos por algum tempo. De caráter poderia-se dizer mais preventivo, é aplicado principalmente ao KEGARI.

O NATURALISMO

Sendo que toda a natureza descende de "kamis" assim como a humanidade, fica claro que tudo está interligado tendo como origem em comum um ancestral divino. Assim sendo o ser humano e a natureza, seus elementos, minerais, vegetais e animais, são irmãos.

A vida dessassociada da natureza é incompatível com o Xintô, o ser humano não deve combatê-la ou transformá-la sem necessidade vital. É comum aos praticantes xintoístas o retiro para ambientes onde possam promover a integração com a natureza, uma forma de purificação, elevação espiritual, e oportunidade para reflexão e meditação.

Como já foi dito na introdução, o Xintô e a própria cultura japonesa pregam que sendo a natureza sagrada, sua destruição é indesejável, e não existe o sentimento de hostilidade inerente recíproca imperante no ocidente, que econtra raízes até mesmo teológicas uma vez que após a explusão do paraíso, era evidente que a natureza do mundo diferente da do Éden, não seria amigável.

Outra prática bastante disseminada é a deificação de determinados elementos naturais em especial. Como por exemplo a árvore que representa um família ou um rocha que ocupa lugar de destaque em determinada cidade. Principalmente na antiguidade, era tradicional em muitas aldeias a veneração de algum "ícone" que representasse bem seu povoado ou dinastia.

O comportamento xintoísta é tão avesso a interferência no cenário natural, para ele é sagrado e perfeito, que qualquer atividade que implique em utilização ostensiva dos recursos naturais deve ser recompensada no mínimo com a construção de um templo dedicado a natureza.

AS MONTANHAS

As montanhas no Japão são muito numerosas e estão envolvidas nos aspectos da vida diária, é delas que brotam os rios, e são consideradas sagradas. Não são kami em si, mas sim moradias de kami. O território montanhoso é tão respeitado que mesmo hoje em dia, o alpinismo não é uma atividade muito difundida pelo povo japonês, e isso num país onde é difícil ver todo um horizonte livre da presença de montanhas.

É muito comum a contrução de templos nessas regiões, assim como cerimônias de deificação e requisição de boas colheitas à "deusa do arrozal" que vive nas montanhas. Nas lendas japonesas as montanhas ocupam lugar de destaque na associação com grandes desafios, buscas e peregrinações.

SACERDOTES

Os sacerdotes Xintoístas podem ser homens ou mulheres e deles não se exige o celibato. Muitas vezes são líderes familiares locais que devido ao seu grau de serviço em relação a religião galgam graus de hierarquia... ( A ser complementado)

TEOLOGIA

Outra constante nas maioria das concepções místico-filosóficas é a presença de um tipo de relação cíclica de causa e efeito muitas vezes resultante numa trindade.

O grande Kami-natureza é de certa forma o CAOS, o ABSOLUTO, a fonte e origem de tudo, ou o Não-Ser, o princípio fundamental. Deles saiu os Kami, que são a "via", a luz. E existe também o ser humano.

O ser humano é dotado com a capacidade de incorporar o grande Kami-natureza e atingir a "via", então essas 3 entidades, o ser Humano, a "via" e o Absoluto tornam-se um só.

A correlação também pode ser entendida como uma forma de santíssima trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, sendo respectivamente Kami, ser humano e o Absoluto, ainda que numa interpretação filosoficamente diferente da tradicional que em se tratando de teologia jamais poderia ser considerada a única "correta".

Trindades como essa estão presentes em várias doutrinas, o Ying-Yang e a união no TAO. A força masculina a feminina e a união, CAOS, EROS e ÉTER.

Nas místicas que dão mais ênfase a questão psicológica é comum vermos o conceito de Consciência numa interpretação mais elevada e geralmente paradoxa, como "a consciência sabe sem saber", ou "é tudo e ao mesmo tempo é nada".

O oriental têm muito mais facilidade de aceitar tais paradoxos que os ocidentais, talvez por não terem sido diretamente submetidos ao ponto de vista mais cientificista de procedência européia, principalmente a lógica cartesiana, o materialismo dialético e o dualismo exclusivista.

Conta-se que na Segunda Guerra Mundial, um certo piloto após uma missão de reconhecimento aéreo pousou seu avião, e fez um relatório onde apresentou informações de vital importância e logo em seguida caiu sem vida. Ao se checar o corpo do piloto, seus companheiros constataram que este já estava frio, morto há várias horas.

O que para os ocidentais já nessa época seria motivo de assombro, investigação científica intesiva, sigilo e sobretudo medo, para os ocidentais a explicação é simples e espontânea. Devido a importância de sua missão o espírito conduziu o corpo mesmo após sua morte, em honra e dedicação sagrada a seu país e o imperador.

Acontecimentos sobrenaturais tendem a ser aceitos pelo povo tradicional japonês sem grandes resistências tanto de cunho ceticista quanto de postura "herética".

EVOLUÇÃO HISTÓRICA

O desenvolvimento do Xintoísmo obedeçe principalmente a 3 períodos distintos.

O Xintô primitivo perdura de períodos indefinidos até cerca do século VI dC. Representava a união das crenças indígenas predominantes no arquipélago do país cujo primeiro nome fora Yamato, devido a liderança desta província sobre as demais. O isolamento natural com certeza garantiu a consolidação e hegemonia necessárias para que mesmo na ausência de qualquer regulamentação teórica, aliás até mesmo de escrita, os mitos populares se cristalizassem na cultura.

A grande maioria dos contos mitológicos provêm dessa fase e obviamente não se pode ter certeza de sua regularidade através dos tempos. Mas como toda e qualquer mitologia, o inconsciente humano garante pelo menos a linhagem básica do mito, variando principalmente na sua manifestação icônica.

Apresenta nessa fase todas as características comuns a qualquer mitologia primitiva, panteísmo, gênese figurativa, com elementos reconhecíveis da própria cultura representando conceitos místicos, e explicações sobre a origem e destino das coisas.

Nessa fase o Xintô sequer tinha nome definido, sua designação mais comum seria kami-no-michi, "a via dos deuses", mas como era praticamente a única, tal distinção não se fazia necessária.

Com a entrada da cultura continental especialmente chinesa no Japão, a partir do século VI dC, houve entre outras coisas a importação de uma filosofia específica, o Confucionismo, e uma nova religião, o Budismo.

Obviamente assim como qualquer sociedade primitiva não havia filosofia pura, aquela desassociada da mística, na terra de Yamato. Mas o Confucionismo caiu como um luva para o modo de vida daquela sociedade, se adaptando facilmente a seus hábitos e justificando muitos de seus costumes.

O Budismo também não representou nenhum choque cultural grave. Primeiro por que trata-se de uma concepção místico-filosófica, que não reclama o status de religião, não têm caráter exclusivista, e não condena necessriamente aquele que não a pratica.

Salvo pequenas exceções o Budismo e o Xintoísmo apresentaram uma convivência pacífica e muitas vezes complementar, muitas idéias do Budismo passaram a ser usadas para explicar mitos xintoístas e muitos kami foram renomeados Budas.

Entretando as diferenças naturais entre elas exigiram que uma distinção fosse feita e só então a crença kami-no-michi ganhou finalmente no século XI d.C. o nome que perdura até hoje.

Somente em 712 d.C. é que surge graças ao esforços de estudiosos, o Kojiki, História das Coisas Antigas, sobre a antiguidade japonesa e mais posteriormente o Nihongi, Crônicas do Japão, em 720 e o Engishiki, já no início do século X. Nesses ecritos antigos têm-se os primeiros registros da história antiga do Japão e das bases mitológicas Xintoístas. Entretanto sua imprecisão é grande, mesmo em fatos históricos como o do provável primeiro imperador Jimmu-Tenno, são cercados de muitas dúvidas quanto as datas em que viveram e o conteúdo exato de seus feitos.

Tendo sido produzidos por decreto imperial, esses registros obedeciam além de interesses de reconstituíção cultural, objetivos "doutrinários", resgatando os elementos primitivos que pudessem embasar a descendência divina imperial e a legitimação sagrada do estado. Dessa forma é evidente que não se pode esperar fidelidade absoluta apenas ao mito primitivo em si, pois os interesses da época com certeza o influenciaram em grau indefinido.

Os mitos recuperados e conservados nesses livros então não têm como representar com total fidelidade o conteúdo mais primitivo do Xintoísmo, e refletem mais a forma como a sociedade da época lidava com a crença.

De qualquer forma o Xintô mesmo não possuindo livro sagrado, começou a ser melhor identificado e regulamentado, mas passou a ser relegado cada vez mais a segundo plano devido a predominância do Budismo, principalmente devido ao total apoio que o princípe Shotoku (573-621) dava a sua disseminação e a da cultura chinesa em geral.

O Budismo passou a ser quase uma espécie de religião oficial, praticado nas côrtes reais, mas o Xintoísmo não foi totalmente esquecido, tendo sempre algum lugar ao lado da predominante religião de procedência chinesa, que durou até o século XVIII.

Nessa fase também surge um aspecto notável, o Ryobu-Xinto, ou Xintô de duas faces. É mais que uma convivência pacífica com o Budismo mas quase um fusão destes. Havia casos de sacerdotes que comungavam nas duas religiões, assim como fiéis Xintô que recorriam ao monges Budistas para obter recursos para seus templos.

Havia rituais duplos tanto em santuários budistas quanto xintoístas mas o mais interessante foi a forma como a filosofia budista explicou a mitologia xintoísta. Entre outras coisas classificou os Kami como encarnações temporárias de Buda, assim como enquadrou toda a mitologia Xintô dentro de um mais abrangente plano universal visto pela ótica budista. Dessa forma o Budismo não desmereceu o Xintô, apenas o reinterpretou extendendo a importâncias do Kami também ao Budismo, que em alguns templos passou a venerá-los tal qual entidades da religião dos Buda.

A própria deusa solar AMATERASU recebeu um nome budista Dai-michi-nyorai, um encarnação da divindade Birshana.

Isso prova que o Xintoísmo não só e compatível com o Budismo como na verdade pode ser até mesmo uma diferente interpretação de alguns de seus aspectos, sendo o Budismo uma crença reencarnacionista, o Xintô que apesar de não explicitar o mesmo ponto de vista também não o condena, podendo ser considerado pelo menos subjetivamente reencarnacionista como praticamente todas as místicas primitivas.

Apesar disso no século XVI, houve a entrada de uma religião totalmente incompatível com o próprio ou com o Budismo. O Cristianismo europeu penetrou no Japão e embora não tenha sido expressivo demograficamente, constituí um fato notável.

Totalmente intolerante com qualquer outro tipo de crença, não plenamente por essência e mais por postura política, o Cristianismo no Japão obviamente não pode contar com a violência das Cruzadas ou da Santa Inquisição, tendo que se valer unicamente de seu apelo emocional e argumentação, o que numa cultura tão diferente, não conseguiu lograr-lhe uma disseminação ampla.

E importante lembrar também que o Japão nunca sofreu uma invasão cultural, mesmo após o fim da Segunda Guerra Mundial a cultura japonesa sobreviveu e se forteleceu de forma homérica.

Uma especialidade do povo japonês é a capacidade de absorver novas idéias ao mesmo tempo que conserva as antigas, e cria coisas novas e próprias enquanto transforma as alheias em seu benefício. Tal comportamento já era de certa forma presente no Xintoísmo e no Budismo e perdura até hoje, dando ao país do Sol Nascente um incrível capacidade de adaptação que lhe permitiu ser uma das nações técnincamente mais avançadas do mundo e ao mesmo tempo uma das mais conservadoras.

Se tomarmos por exemplo as américas, veremos que as culturas originais foram praticamente dizimadas pela cultura européia, principalmente no caráter místico através de uma religião dogmática de comportamento muito mais prático e mundano do que trascendente.

O Japão então foi beneficiado não só pelas condições histórico e geográficas como também pelo fato da religião predominante a ser importada, o Budismo, não praticar a dominação filosófica cultural explícita e muito menos teologicamente defendida.

O "Renascimento", a terceira fase do Xintoísmo ao contrário dos períodos anteriores têm data precisa de início, 1868. Até este ano o Japão encontrava-se sob o Xogunato, o regime dos samurais, mas este dando lugar a uma nova ascenção imperial exigiu do imperador instrumentos psicológicos convincentes para manifestar seu poder perante o povo.

Um desses intrumentos foi a reafirmação da crença xintoísta que dava à família real um caratér divino, descendentes diretos de AMATERASU, deixando esta numa posição bem mais apropriada perante seus súditos.

Nessa época acompanhou também um movimento de reafirmação nacionalista e sendo o Xintô a religião tradicional do Japão, este ganhou um caráter patriótico e de identificação cultural.

Têm início a era Meiji, que modernizou o Japão num ritmo inigualável por qualquer outra nação no mundo, houve também um certa reação ao Budismo e muito maior ao Cristianismo, teologicamente incompatível com o Xintô.

Nessa época surgiu o Xintô de Estado, Jinja-Xinto, que assume o caráter de religião oficial declarada. e outras divisões como o Xintô-Popular, Minkan-Xinto, mais espontâneo, o Xintô-Acadêmico, Fukko-Xinto, o Xintô da Casa Imperial, Koxitsu-Xinto, e o Xintô das Seitas, Kyoha-Xinto, que chegou a abranger 160 seitas.

O Xintô de Estado só vêm a cair em 1946, com a derrota do Japão para os E.U.A. na guerra do pacífico, o imperador então perde seu poder político mantendo apenas o simbólico mas o Xintoísmo não enfraquece, pelo contrário, assume um caráter ainda mais forte de nacionalismo num sentimento patriótico de auto defesa psicológica.

Apesar da reconstrução do Japão, assim como sua modernização de certa forma agredir um princípio básico do Xintoísmo de respeito pela natureza, o Xintô sobrevive dando provas de sua flexibilidade diante da calamidade que se abateu sobre seu povo, que precisou lançar mão entre outras coisas de grande parte dos recursos naturais para se reerguer.

XINTOÍSMO MODERNO

Hoje em dia o Xintoísmo não tendo mais o caráter de religião oficial e nem sendo mais regulamentado politicamente, assume desdobramentos mais espontâneos, e sua convivência com o Budismo, ainda a segunda maior religião do Japão, e outras religiões como o Cristianismo, têm se dado de forma pacífica e harmônica.

O povo nipônico não aceita facilmente o exclusivismo religioso radical, sendo perfeitamente normal a congregação em mais de uma religião. É comum casos de famílias que fazem seus rituais ora num templo ora numa igreja.

Isso praticamente inviabiliza o crescimento de religiões fundamentalistas como O Islamismo, o Shikismo e certas Religiões Protestantes. Ainda assim, todas podem ser encontradas no Japão.

Diversas seitas novas de características Xintoístas têm surgido recentemente sendo muito comumente iniciadas por líderes locais que obtêm "revelações" através de experiências transcendentes. Muitos desses novos messias são, diferente da maioria esmagadora das religiões do mundo, mulheres.

Algumas dessas "novas" religiões, chamadas shinko shukyo, são ainda do período Tokugawa (1603-1868) como a Tenrikyo que tem Nakayama Miki(1798-1887) como fundadora, e cujo nome significa "Religião da Divina Sabedoria".

Outras de 1868 a 1945 como a Omoto, a Hito no Michi e a Soka Gakkai, esta última de características budistas antigas influenciadas pelo budismo Nichiren, e com muito seguidores ocidentais. A famosa Seich-no-Ie é de 1930, fundada por Masaharu Taniguchi.

As surgidas após 1945 são consideradas "novas novas religiões", como a Aum Shinrikyo.

( A ser complementado)

Pois aqui está, FINALMENTE, a "finalização", em:
O XINTOÍSMO E A INDENTIDADE CULTURAL DO JAPÃO.
Ou, melhor dizendo, trata-se de um aperfeiçoamento do tema, com uma visão crítica, e não meramente pedagógica, como este texto original. Abordagem didática esta que, atualmente, não é mais necessária, visto a proliferação de textos pela web sobre o tema, totalmente ausentes na época em que lancei esse escrito acima, e muitos dos quais claramente baseados, se não plagiados, desta minha primeira abordagem do tema.
Assim, fica neste NOVO TEXTO concluída essa breve e preliminar dissertação.

Marcus Valerio XR
2 de Julho de 2008

BIBLIOGRAFIA

ROCHEDIEU, EDMOND. Xintoísmo e As Novas Religiões do Japão. Ed. VERBO Lisboa/São Paulo Junho 1982. No original ROCHEDIEU, EDMOND, Le Shintoisme. Edito-Service S.A. Genebra.

Enciclopédia Mirador Internacional Volume 20. XINTOÍSMO

YAMASHIRO, JOSÉ. História da Cultura Japonesa. Ed. IBRASA. São Paulo 1986.

MONOGRAFIAS
O XINTOÍSMO
e A Identidade Cultural
do Japão
Marcus Valerio XR
98/53596
Universidade de Brasília
Departamento de Letras Tradução
Curso de Licenciatura em Língua Japonesa
Julho de 1999